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Sob um guarda-chuva
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Sotto un parapioggia
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As luzes caíram trêmulas, na calçada. E escorrem líquidas. São luzes de todas as cores, em pequenos naufrágios sobre o asfalto. Se eu pudesse gemer como este vento, como diria o poeta. . . E abro o pequeno céu com asa de morcego mas chove em mim pelo vão de uma estrela. A chuva me dá, sempre, uma sensação de raiz. Tenho a impressão de estar coberto de folhas verdes, espirrando água. O mar estronda, carregado de prata e peixes. E eu logo penso em meu pai, lavrador. Roupa cheirando chuva, o cabelo escorrido na testa. Os sapatos no barro. A chuva, para ele, era uma festa com arco-íris ou sem arco-íris. Pássaro branco sob o guarda-chuva em exercício de ficar parado sinto-me preso entre os quatro pontos cardeais desta esquina pingando horas. Nada mais falso do que um boletim meteorológico. Ganhou da lua e da minha esperança. Onde estarão os pequeninos barcos de papel de minha infância? Estarão jogados, como objetos já sem uso no cemitério dos navios mortos? Penso na seca do Nordeste no país das fatalidades cíclicas e dos contrastes entre a rosa do sol e o Dilúvio. A rosa do sol escondida no abismo do mapa inteiramente cor de cinza. A sensação da ausência, a árvore da chuva desfeita em galhos torrenciais. E eu, aqui, a afogar-me em água e, lá, o Nordeste de rosto enxuto. 2 O céu me atrai, porém a terra — com este cheiro de chuva — me dá uma sensação de raiz. A terra pode mais que o céu, quando a chuva me molha a memória, me fecunda, e eu sinto peixes e orquídeas no corpo. Mas enquanto a chuva cai, torrencial, e o vento a arrasta pelos cabelos de prata, fico pensando, sob o meu guarda-chuva. Penso que é absurdo comparar com a chuva as nossas lágrimas (isso é demais, ó poeta). Lágrimas quentes, que nos queimam os olhos, e caem por dentro sobre ocultas feridas, com este choro sem sal. Além disso, os problemas municipais já esquecidos e os nacionais, também, renascem, sob a chuva. Os automóveis gritam, pedindo passagem, uns roucos, outros tocando um começo de música. Discutem prefeitura e tarde escura a eterna questão do trânsito. Um trovão quis contar-me um violento segredo mas soletrou, apenas. Que monstruosa verdade não terá ele pretendido dizer-me? 3 Deus rabiscou no espaço uma palavra de fogo que não pude entender, por não saber hebraico, mas que deve estar escrita em alguma passagem da Bíblia. Onde terá caído esta faísca elétrica? O que vale, pra mim, é que a casinha pequenina onde nasceu o nosso amor, tem um coqueiro ao lado. E se Franklin inventou pára-raios de luxo para os arranha-céus, Deus botou um coqueiro para servir de pára-raios junto à casa do pobre. Dia sem céu. (Nisto um transeunte saiu correndo, atrás do seu chapéu) |
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Le luci sono cadute tremule, sulla strada. E scorrono liquide. Sono luci di tutti i colori, in piccoli naufragi sull’asfalto. Se io potessi gemere come questo vento, come direbbe il poeta... E apro il piccolo cielo con ali di pipistrello ma piove in me dal vuoto di una stella. La pioggia mi dà, sempre, una sensazione di radice. Ho l’impressione d’esser coperto di foglie verdi, che emanano acqua. Il mare rimbomba, carico d’argento e di pesci. E io subito penso a mio padre, contadino. Vestiti odorosi di pioggia, i capelli grondanti sulla fronte. Le scarpe infangate. La pioggia era, per lui, una festa con arcobaleno o senza arcobaleno. Uccello bianco sotto il parapioggia nel tentativo di rimanere fermo mi sento chiuso tra i quattro punti cardinali sotto questo riparo che gocciola ore. Niente di più falso di un bollettino meteorologico. S’è servito della luna e della mia speranza. Dove saranno le piccole barche di carta della mia infanzia? Giaceranno abbandonate, come oggetti ormai inutili nel cimitero delle navi morte? Penso alla siccità del Nordest nel paese delle tragedie cicliche e dei contrasti tra la rosa del sole e il Diluvio. La rosa del sole nascosta nell’abisso della mappa completamente grigia. La sensazione d’assenza, l’albero della pioggia disfatto in rami torrenziali. E io, qui, ad affogarmi nell’acqua e, là, il Nordest a testa asciutta. 2 Il cielo mi attrae, però la terra — con quest’odore di pioggia — mi dà una sensazione di radice. La terra ha più potere del cielo, quando la pioggia mi bagna la memoria, mi feconda, e io sento pesci e orchidee nel corpo. Ma mentre la pioggia cade, torrenziale, e il vento la trascina per i capelli d’argento, mi metto a pensare, sotto il mio parapioggia. Penso che è assurdo paragonare alla pioggia le nostre lacrime (questo è troppo, poeta). Lacrime calde, che ci bruciano gli occhi, e ci cadono dentro su occulte ferite, con questo pianto senza sale. Per giunta, i problemi municipali già scordati e quelli nazionali, pure, rinascono, sotto la pioggia. Le automobili strombazzano, chiedendo strada, certe rauche, altre suonando un attacco di musica. Discutono prefettura e tarda sera l’eterna questione del traffico. Un tuono voleva confidarmi un violento segreto ma balbettò appena. Quale mostruosa verità avrà mai tentato di dirmi? 3 Dio ha scarabocchiato nello spazio una parola di fuoco che io non ho capito, non sapendo l’ebraico, ma che probabilmente sta scritta in qualche passaggio della Bibbia. Dove sarà caduta quella scarica elettrica? Quel che conta, per me, è che la casetta piccolina dove è nato il nostro amore, abbia una palma al fianco. E se Franklin ha inventato parafulmini di lusso per i grattacieli, Dio ha collocato una palma che facesse da parafulmini accanto alla casa del povero. Giornata senza cielo. (In quella un passante uscì correndo, dietro al suo cappello) |
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Henri Cartier-Bresson Passo nella piazza allagata (1932) |
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