Como se desce uma montanha


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Como se desce uma montanha
Come si scende una montagna


Não é mais fácil
nem menos perigoso
do que subir
          — é diverso.
 
Se olhados de fora
— os gestos —
podem parecer mais lentos.
 
Para quem desce
ao contrário, a sensação
não é de vertigem
— é complemento.
 
Subir foi demorado
descer
          é outra arte.
 
É como se Sísifo
do outro lado do monte
estivesse.
 
Descer com uma pedra
nos ombros
          — pode ser leve.
Non è più facile
né meno pericoloso
che salire
          — è diverso.
 
Se osservati da fuori
— i gesti —
posson sembrare più lenti.
 
Per chi scende
al contrario, la sensazione
non è di vertigine
— è complemento.
 
Fu graduale il salire
scendere
          è arte differente.
 
È come se Sisifo
dall’altro lato del monte
si trovasse.
 
Scendere con una pietra
sul dorso
          — può esser lieve.
________________

Valerie Honnart
Sisifo felice (2012)
...

Cai a tarde sobre meus ombros...


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Cai a tarde sobre meus ombros...
Cade la sera sulle mie spalle...


Cai a tarde
          sobre meus ombros
não apenas
          sobre os Dois Irmãos.

Desaba mais um dia.
Para muitos — de esperança.
Para outros — de humilhação.

Sobre mim
          desaba a história.
Em algum lugar
disseram que há luz
mas o que vejo
          — é a escuridão.
Cade la sera
          sulle mie spalle
non solamente
          sopra i Dois Irmãos.

Precipita un altro giorno.
Per molti — di speranza.
Per altri — d’umiliazione.

Sopra di me
          precipita la storia.
Da qualche parte
han detto che c’è luce
ma quello che io vedo
          — è il buio.
________________

Sarah Sze
Notte (2005)
...

As nuvens


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As nuvens
Le nuvole


As nuvens
não têm preocupações estéticas.
Sou eu
          que as organizo
para meu regozijo esperto.

Elas simplesmente se desfazem
e nem disto sabem
mas eu as estudo, eu as apuro
como Turner
e alguns poetas
que organizaram o entardecer.

A natureza
não tem preocupações morais.
A natureza não mata
Nem odeia.
          Ou melhor:

mata e ama
de igual maneira
e todo movimento
é desejo
          de viver

A morte
é apenas uma forma estranha
da vida
          se refazer.
Le nuvole
non hanno preoccupazioni estetiche.
Sono io
          che le organizzo
per mio puro godimento.

Esse semplicemente si disfano
e nemmeno lo sanno
ma io le studio, io le ritocco
come Turner
e come alcuni poeti
che hanno allestito il crepuscolo.

La natura
non ha preoccupazioni morali.
La natura non uccide
E non odia.
          O meglio:

uccide e ama
in egual misura
ed ogni movimento
è desiderio
          di vivere

La morte
è solamente una forma estrosa
della vita
          di rinnovarsi.
________________

Jan Fabre
L'uomo che misura le nuvole (1998)
...

Estou à tua espera...


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Estou à tua espera...
Sto in attesa di te...


Estou à tua espera
E sou uma multidão que passa,
Flui e reflui, e talvez me impeça
De te ver.
Esperar-te não fará por ti o caminho,
Amar-te não será em ti amor,
Não é sequer a melodia
Que a mim trará o teu coração ouvindo,
Mas espero-te e há por isso
Tanta coisa de mim que voa,
Talvez até ao próprio chão
Não resista a lançar-se no espaço.
Esperar por ti é ouvir-te,
Mesmo que não chegues,
Mesmo que a multidão que passa venha
Impreterível, devolver-me pedaços,
Até me recompor sozinho.
Espero-te e sou assim alguém que lança
Água no deserto e espera
Que, à força de esperar, a água cresça.

Sto in attesa di te
E sono la folla che passa,
Che fluisce e rifluisce, e forse
M’impedisce di vederti.
Aspettarti non aprirà per te il cammino,
Amarti non sarà amore in te,
E non sarà neppure quella melodia
Che indurrà il tuo cuore ad ascoltarmi,
Ma io t’aspetto ed ecco che
Tanta parte di me prende il volo,
Forse persino il mio stesso suolo
Non resiste a lanciarsi nello spazio.
Aspettarti è udirti,
Malgrado tu non giunga,
Malgrado la folla che passa venga
A restituirmi i pezzi, con urgenza
Perché io possa ricompormi da solo.
Io t’aspetto e così sono come uno che semina
Acqua nel deserto e aspetta
Che, a forza d’aspettare, l’acqua cresca.

________________

Salvador Dalí
Galatea e le sfere (1952)
...

Além de mim


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Além de mim
Al di sopra di me


Não é culpa minha
se não estou aparelhado
para entender certos conceitos
e sinais.

Conheço o ódio, o amor, a fome
a ingratidão e a esperança.

(Deus, a eternidade, o átomo e a bactéria
me excedem.)

O que não significa
que os ignore.
Ao contrário:
          por não compreendê-los
          finjo estar calmo
          — e desespero.
Non è colpa mia
se non sono predisposto
per comprendere certi concetti
e segnali.

Conosco l’odio, l’amore, la fame
l’ingratitudine e la speranza.

(Dio, l’eternità, l’atomo e i batteri
mi trascendono.)

Il che non significa
che io li ignori.
Al contrario:
          non comprendendoli
          fingo di star calmo
          — e mi dispero.
________________

Raluca Arnautu
The one who sold his mind (2020)
...

Vestígios


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Vestígios
Vestigia


De algumas coisas não se têm mais vestígios:
utensilios
     obras
          costumes
e sentimentos
          que caíram em desuso.

De algumas coisas nao se têm mais vestígio.

Por isto alguns se calam
outros colam os olhos vagos
          no horizonte
enquanto alguns como arqueólogos
têm sido vistos
          procurando
daquele tempo
          ah! daquele tempo
algum vestígio.
Di certe cose non si hanno più vestigia:
utensili
     opere
          costumi
e sentimenti
          ormai sono caduti in disuso.

Di certe cose non si hanno più vestigia.

Per questo certi ammutoliscono
altri puntano lo sguardo assorto
          verso l’orizzonte
mentre altri ancora come archeologi
son stati visti
          andar cercando
di quel tempo
          oh! di quel tempo
qualche vestigio.
________________

Giorgio de Chirico
Il riposo dell'archeologo (1972)
...

Misterioso conjunto


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Misterioso conjunto
Misterioso insieme


          Me defino como um hombre razonable
          no como professor iluminado
          ni como vate que lo sabe todo.
                  Nicanor Parra
 
Não sei muitas coisas.
 
Às perguntas que minhas filhas fazem
respondo com dificuldade.
 
Por isto há tempos fujo
da verdade cega e absoluta e admito
certa equivalência
entre o que afirmo
e o outro que nega.
 
Separados ou juntos
somos apenas parte
de um misterioso conjunto.
 
Está cheia de vazios e elipses a nossa fala.
Por nós uma luz cortante passa
nos diversifica
e se dispersa nos objetos mínimos da sala.
          Mi definisco un uomo ragionevole
          non un professore illuminato
          né un vate che sa tutto.
                  Nicanor Parra
 
Non so molte cose.
 
Alle domande che fanno le mie figlie
rispondo con difficoltà.
 
Perciò, da tempo, rifuggo
dalla verità cieca e assoluta e ammetto
una certa corrispondenza
tra ciò che io affermo
e che un altro nega.
 
Separati o assieme
Facciamo solo parte
d’un misterioso insieme.
 
È piena di vuoti e di ellissi la nostra parola.
Una luce tagliente ci attraversa
ci diversifica
e si disperde tra i più piccoli oggetti della sala.
________________

Antonella Isanti
Il doppio senso (2006)
...

Luar na Toscana


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Luar na Toscana
Chiar di luna in Toscana


A mim me tocou uma lua cheia em São Geminiano.

O que mais pode querer a alma de um homem
amado por uns, por outros detestado,
que segue os pássaros com os olhos
que deixa fluir com os rios o seu desejo
e tem no bolso uns quatro ou cinco segredos?

A mim me tocou, de novo, a lua cheia
e foi em Certaldo Alto.
Recebi-a calado.
E como era por demais extasiante
depositei-a
nos olhos de minha amante.
Mi commosse una luna piena a San Gimignano.

Cosa può volere di più l’anima d’un uomo
amato da alcuni, da altri detestato,
che segue gli uccelli con lo sguardo
che lascia fluire coi fiumi il suo desiderio
e tiene in tasca quattro o cinque segreti?

Mi commosse, di nuovo, la luna piena
e fu a Certaldo Alto.
L’ho ricevuta in silenzio.
E giacché era oltremodo inebriante
io la posai
sugli occhi della mia amante.
________________

Taddeo di Bartolo
San Gimignano (1391)
...

Estou dizendo para esta lagartixa...


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Estou dizendo para esta lagartixa...
Sto dicendo a questa lucertola...


Estou dizendo para esta lagartixa
na parede do meu quarto
que o século vai acabar
mas ela não me olha
nem me entende.
 
Já tentei falar com a formiga
com a aranha
fui ao limoeiro da horta
e ninguém liga.
 
Olho os objetos da sala
minhas coisas no escritório (os óculos)
e no quarto (os sapatos).
 
Todos indiferentes.
 
Não estão em pânico
não devem nada
e não têm planos.
 
O tempo é mesmo
uma doença humana.
Sto dicendo a questa lucertola
sulla parete della mia stanza
che il secolo sta per finire
ma lei non mi guarda
né mi comprende.
 
Ho già provato a parlare con la formica
col ragno
sono andato dal limone in giardino
e nessuno mi dà retta.
 
Osservo gli oggetti della sala
le mie cose sulla scrivania (gli occhiali)
e in camera (le scarpe).
 
Tutti indifferenti.
 
Non sono in panico
non hanno obblighi
e non hanno progetti.
 
Il tempo è una malattia
prettamente umana.
________________

Lasar Segall
Bambino con lucertole (1924)
...

Num dia, como qualquer outro...


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Num dia, como qualquer outro...
Un giorno, come un altro qualunque...


Num dia, como qualquer outro,
Não reconheces a mulher que amas
E não sabes se esse amor
Ainda lhe pertence, ou a ti, ou sequer se existe.
Em dias como outros, morrem pessoas que amas,
E ficas dentro das suas mortes,
Na órbita de uma ausência
Que recusas infantilmente,
Que recusas sem efeito,
Porque, dia após dia, a morte
Não recuou, não desistiu.
Há quem diga que tudo isto
Acabará por fazer de nós
Pessoas melhores, mais sábias,
Com aquela sabedoria de quem já abriu
Muitas portas, de quem tem
Nos olhos muitos olhares.
É o sangue perdido
Que nos faz melhores?
A voz trémula que julgam ouvir
É certeza, sabedoria? 

Un giorno, come un altro qualunque,
Non riconosci la donna che ami
E non sai se questo amore
Ancora la coinvolga, o coinvolga te, né se esiste.
In giorni uguali ad altri, muoiono persone che ami,
E tu insisti dentro le loro morti,
Nell’orbita di un’assenza
Che infantilmente rifiuti,
Che rifiuti senza esito,
Perché, giorno dopo giorno, la morte
Non retrocede, non desiste.
C’è chi dice che tutto questo
Finirà col fare di noi
Persone migliori, più sagge,
Con la saggezza di chi ha già aperto
Molte porte, di chi ha
Negli occhi molti sguardi.
È il sangue perduto
Che ci rende migliori?
La voce tremula che pensano d’udire
È certezza, saggezza?

________________

Mario Sironi
Alto silenzio (1951)
...

Chegando em casa...


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Chegando em casa...
Tornando a casa...


Chegando em casa
com a alma amarfanhada
e escura
das refregas burocráticas
leio sobre a mesa
um bilhete que dizia:

- hoje 22 de agosto de 1994
meu marido perdeu, deste terraço:

mais um pôr de sol no Dois Irmãos
o canto de um bem-te-vi
e uma orquídea que entardecia
sobre o mar.
Tornando a casa
con l’anima sgualcita
e cupa
per le baruffe burocratiche
leggo sopra il tavolo
un biglietto che dice:

- oggi 22 di agosto 1994
mio marito si è perso, da questo terrazzo:

un altro tramonto dietro i Dois Irmãos
il canto di un pitango
e un’orchidea attardarsi
davanti al mare.
________________

David Hockney
Sun, from the Weather series (1981)
...

Ainda há tempo?


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Ainda há tempo?
C’è ancora tempo?


Ainda há tempo
para o último drinque
à beira do vulcão
ou então
para abrir
o que estava oculto
no sótão ou no porão
por isto é o momento
de descerrar
o indiscernível
sim do não.

Ainda há tempo
de aceitar
a pequenez
e explicar a omissão.
Ainda há tempo
para a carta não escrita
o telefonema tardio
o pedido de desculpa
na garganta enrustido
e um afago na mão.

Ainda há tempo
para entender
o silêncio acre
de Beckett
a ironia espessa
de Ionesco
e de Kafka
a sombria alegoria.

Ainda há tempo
de nos quadros
de Hopper
encarar a solidão
ainda há tempo
de contemplar
os impávidos
cavalos rosas
de Paolo Ucello
na Batalha
de São Romão.

Ainda há tempo
para ouvir
um poema de Li-Po
e três versos
de Bashô,
ainda há tempo
para lembrar Ronsard
Withman e Drummond.

Ainda há tempo
antes que derretam
a calota polar
antes que se perverta
o DNA
antes que envenenem
os rios e
o que sobrou do mar.

A escuridão
pode esperar
ou dissipar-se
quando o dia
teimosamente
amanhecer
com o oboé de Mozart
ou com a ária
na corda de Sol
de Bach.

Ainda há tempo
(gostava de pensar)

Se tempo, há receio,
é para tomar o trem
o navio o avião
ou então
ainda há tempo
para voltar do aeroporto
ou da estação
pegar o rifle
e enfrentar
a enfurecida multidão
ou simplesmente
entregar-lhe o ouro
e esperar
a hora da execuçao.
C’è ancora tempo
per l’ultimo drink
sull’orlo del vulcano
oppure
per scoprire
ciò che stava nascosto
in soffitta o in cantina
perché questo è il momento
di distinguere
l’indiscernibile
sì dal no.

C’è ancora tempo
per riconoscere
la meschinità
e ammettere la negligenza.
C’è ancora tempo
per la lettera non scritta
la telefonata tardiva
per la supplica di perdono
ritrosa nella gola
e per una carezza sulla mano.

C’è ancora tempo
per capire
l’aspro silenzio
di Beckett
la densa ironia
di Ionesco
e di Kafka
la tenebrosa allegoria.

C’è ancora tempo
per affrontare la solitudine
nei quadri
di Hopper
c’è ancora tempo
per contemplare
gli impavidi
cavalli rosa
di Paolo Uccello
nella Battaglia
di San Romano.

C’è ancora tempo
per ascoltare
una poesia di Li-Po
e tre versi
di Bashô,
c’è ancora tempo
per ricordarsi di Ronsard
Withman e Drummond.

C’è ancora tempo
prima che si sciolga
la calotta polare
prima che si modifichi
il DNA
prima che avvelenino
i fiumi e
quel che resta del mare.

L’oscurità
può attendere
o dissiparsi
fintanto che il giorno
costantemente
risorge
con l’oboe di Mozart
o con l’aria
sulla corda di sol
di Bach.

C’è ancora tempo
(mi piacerebbe pensare)

Se c’è tempo, temo,
è per prendere il treno
la nave l’aereo
oppure
c’è ancora tempo
per tornare dall’aeroporto
o dalla stazione
prendere la carabina
e affrontare
la folla infuriata
o semplicemente
consegnare l’oro
e aspettare
l’ora dell’esecuzione.
________________

Thomas Eakins
Suonatore d'oboe (1903)
...

Separação


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Separação
Separazione


Desmontar a casa
e o amor. Despregar
os sentimentos das paredes e lençóis.
Recolher as cortinas
após a tempestade
das conversas.

O amor não resistiu
às balas, pragas, flores
e corpos de intermeio.
Empilhar livros, quadros,
discos e remorsos.
Esperar o infernal
juizo final do desamor.

Vizinhos se assustam de manhã
ante os destroços junto à porta:
pareciam se amar tanto!

Houve um tempo:
          uma casa de campo,
          fotos em Veneza,
um tempo em que sorridente
o amor aglutinava festas e jantares.

Amou-se um certo modo de despir-se
de pentear-se.
Amou-se um sorriso e um certo
modo de botar a mesa. Amou-se
um certo modo de amar.

No entanto, o amor bate em retirada
com suas roupas amassadas, tropas de insultos
malas desesperadas, soluços embargados.

Faltou amor no amor?
Gastou-se o amor no amor?
Fartou-se o amor?

No quarto dos filhos
outra derrota à vista:
bonecos e brinquedos pendem
numa colagem de afetos natimortos.

O amor ruiu e tem pressa de ir embora
envergonhado.
Erguerá outra casa, o amor?
Escolherá objetos, morará na praia?
Viajará na neve e na neblina?

Tonto, perplexo, sem rumo
um corpo sai porta afora
com pedaços de passado na cabeça
e um impreciso futuro.

No peito o coração pesa
mais que uma mala de chumbo.
Smontare la casa
e l’amore. Staccare
i sentimenti da pareti e lenzuola.
Levare le tende
dopo la tempesta
delle discussioni.

L´amore non ha resistito
a colpi, insulti, fiori
e corpi mediatori.
Impilare libri, quadri,
dischi e rimorsi.
Aspettare l’infernale
giudizio finale del distacco.

I vicini si spaventano la mattina
davanti ai detriti accanto alla porta:
— pareva s’amassero tanto!

Vi fu un tempo:
          una casa di campagna,
          foto a Venezia,
un tempo in cui sorridente
l’amore amalgamava feste e cibo.

Si amò un certo modo di spogliarsi,
di pettinarsi.
Si amò un sorriso e un certo
modo di preparar la tavola.  Si amò
un certo modo di amare.

Eppure, l’amore batte in ritirata
coi suoi panni ammucchiati, sfilza di insulti
valigie disperate, singhiozzi trattenuti.

S'è spento l'amore nell'amore?
S'è consumato l'amore nell'amore?
S'è stancato l'amore?

Nella stanza dei figli
un’altra sconfitta in vista:
pupazzi e giocattoli pendono
in un collage di affetti nati morti.

L’amore è crollato e ha fretta di andar via
vergognoso.
Erigerà un’altra casa, l’amore?
Sceglierà oggetti, riposerà sulla spiaggia?
Viaggerà con la neve e la nebbia?

Attonito, perplesso, senza meta
un corpo esce di casa
con frammenti di passato per la testa
e un impreciso futuro.

Nel petto il cuore pesa
più di una valigia di piombo.
________________

Luiz Philippe Carneiro de Mendonça
Valigie di pietra (2009)
...

Despedidas


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Despedidas
Addii


Começo a olhar as coisas
como quem, se despedindo, se surpreende
com a singularidade
que cada coisa tem
de ser e estar.

Um beija-flor no entardecer desta montanha
a meio metro de mim, tão íntimo,
essas flores às quatro horas da tarde, tão cúmplices,
a umidade da grama na sola dos pés, as estrelas
daqui a pouco, que intimidade tenho com as estrelas
quanto mais habito a noite!

Nada mais é gratuito, tudo é ritual.
Começo a amar as coisas
com o desprendimento que só têm
os que amando tudo o que perderam
já não mentem.
Comincio a guardare le cose
come chi, nel congedarsi, si sorprende
per l’unicità
che ogni cosa ha
d’essere ed esistere.

Un colibrì all’imbrunire su questo monte
a mezzo metro da me, così intimo,
questi fiori alle quattro del pomeriggio, così complici,
l’umidità dell’erba sotto i piedi, le stelle
fra non molto, che intimità mi lega alle stelle
quanto più abito la notte!

Non v’è più nulla di gratuito, tutto è rituale.
Comincio ad amare le cose
con il distacco che hanno soltanto
quelli che amando tutto ciò che hanno perso
ormai più non s’illudono.
________________

Edvard Munch
Notte stellata (1922-1924)
...

Viva fera


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Viva fera
Fiera viva


Não me canso de estudar a morte.
Como é fértil e reverbera novos ângulos
conforme a hora em que a entrevejo
na minha trajetória.

Preencho-a de significados vários.
Ela cresce, me fascina, me enriquece,
me habita viva feito fera
que parece domesticada e, no entanto,
soberana
          - mansamente me devora.
Non mi stanco di studiare la morte.
Quant’è versatile e riverbera nuove visuali
a seconda dell’ora in cui la intravedo
sulla mia traiettoria.

La riempio di significati vari.
Ella cresce, m’affascina, m’arricchisce,
viva mi abita come una fiera
che sembra addomesticata eppure,
sovrana
          - pacatamente mi divora.
________________

Yan Pei-Ming
Tigri e avvoltoi (2015)
...

Textamento


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Textamento
Testamento


Minha mãe teve dúvidas
se eu deveria nascer ou não.
Pensou em me abortar.
Nasci. E, de alguma maneira, dei certo.
Cedo aprendi com os animais domésticos
E com os legumes da horta
Que a morte é estranhamente cotidiana.

Amei, sim, amei
na medida do meu descompassado desejo.
E já ia envelhecendo
quando aprendi a me comunicar com os cães.

Não posso me queixar.
Vencidas as dificuldades iniciais,
os limites do quintal, a inveja
e os jogos na boca da noite,
descobri modos de me expressar.
Algumas palavras íntimas
tornaram-se públicas
e nisto encontrei satisfação.
Mia madre era indecisa
se io dovessi nascere o no.
Meditò di abortire.
Nacqui. E, in qualche modo, andò bene così.
Imparai presto dagli animali domestici
E dalle verdure dell’orto
Che la morte è stranamente quotidiana.

Ho amato, sì, ho amato
in proporzione al mio sregolato desiderio.
E stavo già invecchiando
quando ho appreso a comunicare coi cani.

Non posso lamentarmi.
Superate le difficoltà iniziali,
i confini del cortile, l’invidia
e i giochi sul far della notte,
scoprii come fare per comunicare.
Alcune parole intime
diventarono pubbliche
e fu questo a darmi appagamento.
________________

Giacomo Ceruti
Vecchio con carlino (1740)
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Nuvola degli autori (e alcune opere)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant’Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (39) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (44) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (40) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (433) Pássaro de vidro (52) Poemas dos dias (23) Poemas Sociais (30) Reinaldo Ferreira (10) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)