Avião


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Horto de incêndio (1997) »»
 
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Avião
Aereo


envolto num lençol de cal duas cintilações
sobre as pálpebras húmidas e um ardor perfura
a noite onde uma ponte atravessa um rio

o vôo é demorado
ficaste a saber que nem deus é eterno
desfez-se no erro daquilo que criou perdeu-se
nas suas imperfeições e certezas

agora pela janela do avião vês como tudo é mínimo
lá em baixo – quando a oriente da loucura
a mão cinzenta do inverno perdura no rosto
daqueles que sonolentos viajam dentro
deste pequeno túmulo de serenidade

fasciato in un lenzuolo di calce due luccichii
sopra le palpebre umide e un ardore perfora
la notte dove un ponte attraversa un fiume

è lento il volo
sei venuto a sapere che neppure dio è eterno
s’è dissolto nell’errore di quel che creò s’è smarrito
nelle sue imperfezioni e sicurezze

ora dal finestrino dell’aereo vedi come tutto è piccino
laggiù – quando a oriente della follia
la grigia mano dell’inverno permane sul volto
di quelli che assonnati viaggiano dentro
questo piccolo loculo di serenità

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Anselm Kiefer
Gli Argonauti (2017)
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Acordar tarde


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Horto de incêndio (1997) »»
 
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Acordar tarde
Destarsi tardi


tocas as flores murchas que alguém te ofereceu
quando o rio parou de correr e a noite
foi tão luminosa quanto a mota que falhou
a curva - e o serviço postal não funcionou
no dia seguinte

procuras ávido aquilo que o mar não devorou
e passas a língua na cola dos selos lambidos
por assassinos - e a tua mão segurando a faca
cujo gume possui a fatalidade do sangue contaminado
dos amantes ocasionais - nada a fazer

irás sozinho vida dentro
os braços estendidos como se entrasses na água
o corpo num arco de pedra tenso simulando
a casa
onde me abrigo do mortal brilho do meio-dia

tocchi i fiori avvizziti che qualcuno t’ha regalato
quando il fiume sospese la sua corsa e la notte
divenne luminosa quanto la moto che mancò
la curva - e il servizio postale non funzionò
il giorno dopo

avidamente cerchi quel che il mare non ha inghiottito
e ripassi la lingua sulla colla dei francobolli lambiti
da assassini - e la tua mano sta impugnando il coltello
la cui lama possiede l’ineluttabilità del sangue contaminato
degli amanti occasionali - niente da fare

te ne andrai da solo per la vita
le braccia allungate come se entrassi nell’acqua
il corpo come un arco di pietra teso ad emulare
la casa
dove mi rintano dal mortale fulgore del mezzogiorno

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Mario Mafai
Fiori secchi (1937)
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No exíguo espaço do corpo...


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O livro dos regressos (1989) »»
 
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No exíguo espaço do corpo...
Nell’esiguo spazio del corpo...


no exíguo espaço do corpo ou da casa
tentas perpetuar a forma dos brinquedos acesos
por um misterioso cordel de poeira luminosa

sabes como é falso o tempo das imagens
dos gestos inacabados que te evocam o rosto
perdido no confuso sémen dos sonhos

e ao anoitecer adquires nome de ilha ou de vulcão
deixas viver sobre a pele uma criança de lume
e na fria lava da noite ensinas ao corpo
a paciência o amor o abandono das palavras
o silêncio
e a difícil arte da melancolia

nell’esiguo spazio del corpo o della casa
tenti d’immortalare la forma dei balocchi illuminati
da un misterioso intreccio di polvere luminosa

tu sai come è falso il tempo delle immagini
dei gesti incompiuti che ti evocano il viso
perduto nel confuso embrione dei sogni

e sul far della notte assumi nome d’isola o di vulcano
lasci vivere sulla pelle un fanciullo di fuoco
e nella fredda lava della notte insegni al corpo
la pazienza l’amore l’abbandono delle parole
il silenzio
e la difficile arte della malinconia

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Odd Nerdrum
Malinconia (2002)
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O silêncio dobra o dia...


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Nuno Rocha Morais »»
 
Poesie inedite »»
nunorochamorais.blogspot.com (octobre 2020) »»
 
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O silêncio dobra o dia...
Il silenzio ripiega il giorno...


O silêncio dobra o dia,
Deposita-o no cinerário dos passados,
A noite liberta-se.
Sente-se.

Aqui me sento.
Espero que ela me lacre,
Que ela acabe comigo qual hoje fui,
Que do centro dela
Eu nada veja para trás o quanto fui.

A noite vem despertar um pouco mais
A minha vocação para a morte,
O morto que cresce e me estagna,
E me enlameia.
Preparo-me para renascer.

Il silenzio ripiega il giorno,
Lo deposita nel cinerario dei trapassati,
La notte ritorna libera.
Si sente.

Qui mi siedo.
Aspetto che lei mi sigilli,
Che lei finisca per me quel che oggi son stato,
Che dal suo centro
Io non riveda fin dove sono stato.

La notte viene a risvegliare un po’ di più
La mia vocazione per la morte,
Quel morto che cresce e mi sfibra,
E m’insudicia.
Mi preparo a rinascere.

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Nicolas Poussin
I pastori di Arcadia (1638-40)

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Quase nunca estive morto...


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Lunário (1988) »»
 
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Quase nunca estive morto...
Quasi mai son stato morto...


Quase nunca estive morto,
excepto nalgumas fotografias:
o sorriso que nelas se imobilizou já não existe.
E as fotografias são quase de certeza,
acidentes na biografia do fotógrafo -
revelam muito mais sobre o fotógrafo do que
sobre aquilo que fotografou.
E não pintamos, nem escrevemos
ou fotografamos para nos salvar,
ou então é só por isso que o fazemos.
De qualquer maneira, sabemos
que se não o fizermos
estamos mais rapidamente perdidos,
e é tudo... Mas por outro lado,
deparar com a precariedade da vida,
e com a inquietante perenidade dos vestígios
que nos sobrevirão, torna-se muito doloroso.

Quasi mai son stato morto,
tranne in qualche fotografia:
il sorriso che lì s’è fermato più non esiste.
E le fotografie sono quasi di certo,
degli imprevisti nella biografia del fotografo -
rivelano molte più cose del fotografo che
di colui ch’egli ha fotografato.
E non dipingiamo né scriviamo
o fotografiamo per salvarci,
oppure è solo per questo che lo facciamo.
In ogni caso, sappiamo
che se non lo facessimo
finiremmo perduti più rapidamente,
ed è tutto... Ma d’altra parte,
incappare nella precarietà della vita,
e nell’inquietante perennità delle vestigia
che ci sopravviveranno, diventa molto doloroso.

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Al Berto, fotografato da Paulo Nozolino
per la copertina di "Horto de Incêndio" (1997)
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Encomenda Postal


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O medo (1987) - (Sete Poemas do Regresso de Lázaro, 1985) »»
 
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Encomenda postal
Consegna postale


destino-te a tarefa de me sepultares
no segredo mineral da noite
com um lápis e uma máquina fotográfica

depois
fica atento ao correio
do secular laboratório nocturno enviar-te-ei
devidamente autografado
o retrato da solidão que te pertenceu

e numa encomenda à parte receberás
a revelação desta arte
onde a vida cinzelou o precário corpo
na luz afiada de um vestígio de tinta

t’affido il compito di seppellirmi
nel segreto minerale della notte
con una matita e una macchina fotografica

poi
fa’ attenzione alla posta
dal laico laboratorio notturno io ti invierò
debitamente autografato
il ritratto della solitudine che t’è appartenuta

e in consegna separata riceverai
la rivelazione di quest’arte
dove la vita ha impresso il precario corpo
nella tagliente luce d’una traccia d’inchiostro

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Al Berto, fotografato da Paulo Nozolino
per la copertina di "O Medo" (1987)
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Os amigos


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O medo (1987) - (Sete Poemas do Regresso de Lázaro, 1985) »»
 
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Os amigos
Gli amici


no regresso encontrei aqueles
que haviam estendido o sedento corpo
sobre infindáveis areias

tinham os gestos lentos das feras amansadas
e o mar iluminava-lhes as máscaras
esculpidas pelo dedo errante da noite

prendiam sóis nos cabelos entrançados
lentamente
moldavam o rosto lívido como um osso
mas estavam vivos quando lhes toquei
depois
a solidão transformou-os de novo em dor
e nenhum quis pernoitar na respiração
do lume

ofereci-lhes mel e ensinei-os a escutar
a flor que murcha no estremecer da luz
levei-os comigo
até onde o perfume insensato de um poema
os transmudou em remota e resignada ausência

sulla via del ritorno trovai quelli
che avevano disteso il corpo assetato
su interminabili sabbie

avevano i gesti lenti delle belve ammansite
e il mare ravvivava per loro le maschere
scolpite dal dito errante della notte

imprigionavano soli nei capelli intrecciati
lentamente
modellavano il loro viso livido come un osso
ma erano vivi quando li toccai
dopo
la solitudine li trasformò di nuovo in dolore
e nessuno volle passar la notte nel respiro
del fuoco

offrii loro del miele e insegnai ad ascoltare
il fiore che appassisce nei sussulti della luce
li portai con me
fin là dove il profumo insensato d’una poesia
li trasformò in remota e rassegnata assenza

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Giorgio Vasari
Ritratto di sei poeti toscani (1544)
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Corpo


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O medo (1987) - (A Noite Progride Puxada à Sirga, 1985) »»
 
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Corpo
Corpo


corpo 
que te seja leve o peso das estrelas
e de tua boca irrompa a inocência nua
dum lírio cujo caule se estende e
ramifica para lá dos alicerces da casa

abre a janela debruça-te
deixa que o mar inunde os órgãos do corpo
espalha lume na ponta dos dedos e toca
ao de leve aquilo que deve ser preservado

mas olho para as mãos e leio
o que o vento norte escreveu sobre as dunas

levanto-me do fundo de ti humilde lama
e num soluço da respiração sei que estou vivo
sou o centro sísmico do mundo

corpo
che ti sia lieve il peso delle stelle
e dalla tua bocca irrompa l’innocenza nuda
d’un giglio il cui stelo s’estenda e
ramifichi oltre le fondamenta della casa

apri la finestra affacciati
lascia che il mare inondi gli organi del corpo
che si propaghi il fuoco sulla punta delle dita e tocchi
lievemente ciò che dev’essere preservato

ma guardo le mie mani e leggo
ciò che il vento del nord ha scritto sulle dune

mi sollevo dal fondo di te umile limo
e in un singhiozzo del respiro so che sono vivo
io sono l’epicentro del mondo

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Pugilatore in riposo
Scultura greca in bronzo del I sec.a.C.
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Enquanto falavas de um mar...


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O medo (1987) - (O Esquecimento em Yucatán, 1982-83) »»
 
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Enquanto falavas de um mar...
Mentre parlavi di un mare...


Enquanto falavas de um mar
derramei sobre o peito os escombros da casa
reconheci-te
nos alicerces devorados pelas raízes das palmeiras
na sombra da ave deslizando junto à parede
no foco de luz rompendo o tijolo onde estivera a chaminé
vivemos aqui
com o ruído dum cano ressumando água
até que o frio nos fez abandonar o lugar e o amor
 
não sei para onde foste morrer
eu continuo aqui... escrevo
alheio ao ódio e às variações do gosto e da simpatia
continuo a construir o relâmpago das palavras
que te farão regressar... ao anoitecer
há uma sensação de aves do outro lado das portas
os corpos caídos
a vida toda destinada à demolição
 
tento perder a memória
única tarefa que tem a ver com a eternidade
de resto... creio que nunca ali estivemos
e nada disto provavelmente se passou aqui 

Mentre tu parlavi di un mare
ho sparso sul petto le macerie della casa
ti ho riconosciuto
nelle fondamenta divorate dalle radici delle palme
nell’ombra dell’uccello che scivola lungo la parete
nel raggio di luce che fora il mattone dove c’era il camino
abbiamo vissuto qui
col rumore di un tubo che gocciolava acqua
finché il freddo ci ha fatto abbandonare il luogo e l’amore
 
non so dove sei andato a morire
io sono rimasto qui... scrivo
estraneo all’odio e alle variazioni dei gusti e della simpatia
vado avanti costruendo le folgoranti parole
che ti faranno tornare... all’imbrunire
si ha una sensazione di uccelli fuori dalla porta
i corpi precipitati
la vita intera destinata alla demolizione
 
cerco di perdere la memoria
unico compito che ha a che fare con l’eternità
del resto... credo che non siamo mai stati là
e forse niente di tutto questo è mai successo qui

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Lucie Richard-Bertrand
Hara House (2020)
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Nomeio constelações...


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Uma Existência de Papel (1985) »»
 
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Nomeio constelações...
Chiamo per nome le costellazioni...


nomeio constelações uso-as
para me guiarem no receio das noites
escavo corpos na fexibilidade das sombras
atravesso a manhã e ponho a descoberto
a casa onde a infância secou

o olhar desce aos gestos inacabados
satura-os de jovens lágrimas de resinas
e o susto da criança que fui reaviva
um pouco de alegria no coração

chiamo per nome le costellazioni le uso
perché mi guidino nel timore delle notti
dissotterro corpi nella flessibilità delle ombre
attraverso il mattino e metto allo scoperto
la casa dove s’è consumata l’infanzia

lo sguardo si posa sui gesti incompiuti
li satura di giovani lacrime resinose
e lo stupore del bimbo che io fui riaccende
un poco d’allegria nel cuore

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Disco di Nebra
Cielo stellato (circa 1600 a.C.)
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Mais nada se move em cima do papel...


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Uma Existência de Papel (1985) »»
 
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Mais nada se move em cima do papel...
Più nulla si muove sulla carta...


mais nada se move em cima do papel
nenhum olho de tinta iridescente pressagia
o destino deste corpo

os dedos cintilam no húmus da terra
e eu
indiferente à sonolência da língua
ouço o eco do amor há muito soterrado

encosto a cabeça na luz e tudo esqueço
no interior desta ânfora alucinada

desço com a lentidão ruiva das feras
ao nervo onde a boca procura o sul
e os lugares dantes povoados
ah meu amigo
demoraste tanto a voltar dessa viagem

o mar subiu ao degrau das manhãs idosas
inundou o corpo quebrado pela serena desilusão

assim me habituei a morrer sem ti
com uma esferográfica cravada no coração

più nulla si muove sulla carta
nessun occhio d’inchiostro iridescente presagiva
il destino di questo corpo

le dita scintillano nell’humus della terra
e io
indifferente alla sonnolenza della lingua
ascolto l’eco dell’amore da tempo sepolto

reclino il capo nella luce e dimentico tutto
all’interno di quest’anfora allucinata

scendo con la sanguigna lentezza delle fiere
al nervo dove la bocca va in cerca del sud
e dei luoghi un tempo abitati
ah amico mio
hai tardato tanto a tornare da questo viaggio

il mare s’è alzato al livello delle mattine antiche
ha inondato il corpo spezzato dal sereno disincanto

così mi sono abituato a morire senza di te
con una penna a sfera conficcata nel cuore

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Aaron Wexler
La forma dell'acqua (2016)
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Visita-me enquanto não envelheço...


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Salsugem (1984) »»
 
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Visita-me enquanto não envelheço...
Vieni a trovarmi prima che io invecchi...


visita-me enquanto não envelheço
toma estas palavras cheias de medo e surpreende-me
com teu rosto de Modigliani suicidado

tenho uma varanda ampla cheia de malvas
e o marulhar das noites povoadas de peixes voadores

ver-me antes que a bruma contamine os alicerces
as pedras nacaradas deste vulcão a lava do desejo
subindo à boca sulfurosa dos espelhos

antes que desperte em mim o grito
dalguma terna Jeanne Hébuterne a paixão
derrama-se quando tua ausência se prende às veias
prontas a esvaziarem-se do rubro ouro

perco-te no sono das marítimas paisagens
estas feridas de barro e quartzo
os olhos escancarados para a infindável água

com teu sabor de açúcar queimado em redor da noite
sonhar perto do coração que não sabe como tocar-te

vieni a trovarmi prima che io invecchi
prendi queste parole piene di paura e stupiscimi
col tuo volto da Modigliani suicidato

ho una veranda ampia piena di malva
e lo sciabordio delle notti popolate di pesci volanti

vieni a vedermi prima che la bruma contamini le fondamenta
le pietre iridescenti di questo vulcano la lava del desiderio
che sale alla bocca solforosa degli specchi

prima che si ridesti in me il grido
di qualche dolce Jeanne Hébuterne la passione
dilaga quando la tua assenza s’aggrappa alle vene
pronte a svuotarsi dell’oro rosso

ti perdo nel sonno dei paesaggi marittimi
queste ferite d’argilla e quarzo
gli occhi spalancati verso quest’acqua infinita

col tuo sapore di zucchero bruciato ovunque nella notte
sognare vicino al cuore che non sa come toccarti

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Amedeo Modigliani
Ritratto di Jeanne Hébuterne (1919)
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Se um dia a juventude voltasse...


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Se um dia a juventude voltasse...
Se un giorno la gioventù tornasse...


se um dia a juventude voltasse
na pele das serpentes atravessaria toda a memória
com a língua em teus cabelos dormiria no sossego
da noite transformada em pássaro de lume cortante
como a navalha de vidro que nos sinaliza a vida

sulcaria com as unhas o medo de te perder... eu
veleiro sem madrugadas nem promessas nem riqueza
apenas um vazio sem dimensão nas algibeiras
porque só aquele que nada possui e tudo partilhou
pode devassar a noite doutros corpos inocentes
sem se ferir no esplendor breve do amor

depois... mudaria de nome de casa de cidade de rio
de noite visitaria amigos que pouco dormem e têm gatos
mas aconteça o que tem de acontecer
não estou triste não tenho projectos nem ambições
guardo a fera que segrega a insónia e solta os ventos
espalho a saliva das visões pela demorada noite
onde deambula a melancolia lunar do corpo

mas se a juventude viesse novamente do fundo de mim
com suas raízes de escamas em forma de coração
e me chegasse à boca a sombra do rosto esquecido
pegaria sem hesitações no leme do frágil barco... eu
humilde e cansado piloto
que só de te sonhar me morro de aflição

se un giorno la gioventù tornasse
nella pelle dei serpenti ripercorrerei tutta la memoria
con la lingua nei tuoi capelli dormirei nella quiete
della notte trasformata in uccello di luce tagliente
come la lama di vetro che ci segnala la vita

solcherei con le unghie la paura di perderti... io
veliero senza aurore né promesse né ricchezza
soltanto con un vuoto infinito nelle tasche
perché solo colui che nulla possiede e tutto ha condiviso
può invadere la notte d’altri corpi innocenti
senza ferirsi nel breve splendore dell’amore

dopo... cambierei di nome di casa di città di fiume
la notte visiterei amici che dormono poco e hanno gatti
ma succeda quel deve succedere
non sono triste non ho progetti né ambizioni
tengo a bada la fiera che segrega l’insonnia e scioglie i venti
spargo la saliva delle visioni per la notte tardiva
ove passeggia la malinconia lunare del corpo

Ma se la gioventù nuovamente mi risalisse dal profondo
con le sue radici squamose a forma di cuore
e mi arrivasse alla bocca l’ombra del volto scordato
mi metterei senza esitazione al timone della fragile barca... io
umile e stanco pilota
che solo a sognarti mi sento morire di tormento

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Fernand Khnopff
Le carezze (1896)
...

Quando aqui não estás...


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Quando aqui não estás...
Quando tu non sei qui...


Quando aqui não estás
o que nos rodeou põe-se a morrer

a janela que abre para o mar
continua fechada só nos sonhos
me ergo
abro-a
deixo a frescura e a força da manhã
escorrerem pelos dedos prisioneiros
da tristeza
acordo
para a cegante claridade das ondas

um rosto desenvolve-se nítido
além
rasando o sal da imensa ausência
uma voz

quero morrer
com uma overdose de beleza

e num sussurro o corpo apaziguado
perscruta esse coração
esse
solitário caçador

Quando tu non sei qui
quel che ci stava intorno prende a morire

la finestra che s’apre verso il mare
rimane chiusa solo nei sogni
mi alzo
la apro
lascio che la frescura e il vigore del mattino
scorrano tra le dita prigioniere
della tristezza
mi risveglio
all’accecante luminosità delle onde

un volto si ricompone nitido
più in là
colmando di sale l’immensa assenza
una voce

voglio morire
con un’overdose di bellezza

e in un sussurro il corpo acquietato
scandaglia questo cuore
questo
solitario cacciatore

________________

Tano Festa
La finestra (1974)
...

Procuro-te no meio dos papéis escritos...


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Procuro-te no meio dos papéis escritos...
Ti cerco in mezzo alle carte scritte...


procuro-te no meio dos papéis escritos
atirados para o fundo do armário de vidrinhos
comias uvas no meio da página

a seguir era como se fosse noite
havia olhares que se cruzavam corpos
deambulações pela praia
era noite e alguém se aproximava

eu estava passeando os dedos
pelas nódoas frescas do vinho sobre a mesa o caderno
onde de quando em quando rabiscava um rosto
e listas de nomes que não queria esquecer

paguei o pão o vinho o queijo
levantei-me
tu cortaste-me a fuga vagarosamente preparada
pediste-me um cigarro

na outra página estávamos rindo
estendidos no pobre embarcadouro de madeira
planeávamos atravessar a noite mágica do rio

a página seguinte está em branco
mas lembro-me que te agarrei a mão e disse:
todos os cigarros do mundo são para ti

ti cerco in mezzo alle carte scritte
gettate sul fondo della credenza vetrata
tu mangiavi dell’uva a metà della pagina

in seguito era come se fosse notte
c’era un incrociarsi di sguardi corpi
passeggiate sulla spiaggia
era notte e qualcuno s’avvicinava

io stavo scorrendo le dita
tra le macchie fresche di vino sul tavolo il quaderno
dove di tanto in tanto schizzavo un viso
e liste di nomi che non volevo scordare

pagai il pane il vino il formaggio
mi alzai
tu mi bloccasti la fuga pacatamente preparata
mi chiedesti una sigaretta

sull’altra pagina stavamo ridendo
stesi sullo spoglio imbarcadero di legno
progettavamo di attraversare la notte magica del fiume

la pagina seguente è in bianco
ma mi ricordo che t’afferrai la mano e dissi:
tutte le sigarette del mondo sono per te

________________

Torio Toroi
Mozziconi di sigaretta (2019)
...

Pernoitas em mim...


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Pernoitas em mim...
Tu passi la notte in me...


pernoitas em mim
e se por acaso te toco a memória... amas
ou finges morrer

pressinto o aroma luminoso dos fogos
escuto o rumor da terra molhada
a fala queimada das estrelas

é noite ainda
o corpo ausente instala-se vagarosamente
envelheço com a nómada solidão das aves

já não possuo a brancura oculta das palavras
e nenhum lume irrompe para beberes

tu passi la notte in me
e se per caso ti sfioro la memoria... ami
o fingi di morire

riconosco l’aroma luminoso dei fuochi
ascolto il rumore della terra bagnata
l’idioma riarso delle stelle

è notte ancora
il corpo assente s’installa delicatamente
invecchio con la solitudine nomade degli uccelli

più non possiedo l’occulto candore delle parole
e nessuna luce irrompe perché tu la beva

________________

Joan Miró
Figure di notte guidate dalle tracce
fosforescenti delle lumache (1940)
...

Nuvola degli autori (e alcune opere)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant’Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (39) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (44) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (40) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (433) Pássaro de vidro (52) Poemas dos dias (23) Poemas Sociais (30) Reinaldo Ferreira (10) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)