Quem foi pedra e peixe...


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Quem foi pedra e peixe...
Chi fu pietra e pesce...


Quem foi pedra e peixe antes de ser pássaro,
quem foi barro e árvore antes de ser nuvem,
quem foi homem antes de ser mulher
e mulher antes de ser homem,
pai antes de ser filho e vagido
antes de ser música
transporta um saber anterior
ao dom da palavra.
Chi fu pietra e pesce prima d’essere uccello,
chi fu argilla e albero prima d’essere nuvola,
chi fu uomo prima d’essere donna
e donna prima d’essere uomo,
padre prima d’essere figlio e vagito
prima d’essere musica
porta con sé una sapienza anteriore
al dono della parola.
________________

Wangechi Mutu
Mamaray (2020)
...

Entre as árvores e as pedras...


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Entre as árvores e as pedras...
Tra gli alberi e le pietre...


Entre as árvores e as pedras que
se contemplam há séculos
no Claustro de Saint-Fulcran
introduzo a minha humanidade.
— Também eu, deixem-me sentar a vosso lado,
sou um bicho da terra. Uma nuvem
que passa, um pássaro
que já não sabe voar.

As pedras (árvores um pouco
mais antigas) e as árvores (aves
que todos os anos dão flor) deixaram
que me sentasse entre elas.
— Ao que vens? perguntaram.
— Sou poeta, sou um vaso que se abre
a todas as águas
mas estou cansado dos homens
e das suas guerras.

— Senta-te, esquece o corpo, aproxima-te
do começo do tempo.
E o meu corpo abriu-se em flor
e em pedra e em água como se nada fosse
ou sempre tivesse sido.
E a sombra da árvore foi uma praia
onde fui menino; e as pedras da catedral
deixaram que partilhasse com elas
o meu desamparado coração.
Tra gli alberi e le pietre che
si contemplano da secoli
nel Chiostro di Saint-Fulcran
immetto la mia umanità.
— Sono anch’io, e permettete che vi sieda accanto,
una creatura terrestre. Una nuvola
di passaggio, un uccello
che non sa più volare.

Le pietre (alberi un po’
più antichi) e gli alberi (uccelli
che tutti gli anni danno fiori) mi hanno permesso
di sedermi in mezzo a loro.
— Come mai qui? mi hanno chiesto.
— Sono poeta, sono un vaso che accoglie
tutte le acque
ma sono stanco degli uomini
e delle loro guerre.

— Siediti, scordati il corpo, incamminati
verso l’inizio del tempo.
E il mio corpo s’è schiuso in fiore
e in pietra e in acqua come se nulla fosse
o fosse sempre stato così.
E l’ombra dell’albero è divenuta una spiaggia
dove io fui da bambino; e le pietre della cattedrale
hanno permesso che dividessi con loro
il mio cuore desolato.
________________

Emil Nolde
Luce ed acqua (1930)
...

Amar a vida inteira - 2


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Amar a vida inteira - 2
Amare la vita intera - 2


Foram aves polidas na boca dos poetas
e na boca do vento polidas
as palavras de lume
sobre as maravilhas do mundo e as outras,
as que foram criadas pelo homem, a quem a morte
jamais se furta quando ele demanda
auxílio. Palavras luminosas de agonia
que pedras cegas festejadas pelo sol e pelas águas
ouviram. O mistério ouviram, esse que perdura
tanto nos poemas como na sílica em sua disputa
pela arte mais obsessiva: o ofício
da duração. Amar a vida inteira.
Por mim, que fui feliz em Epidauro, em Jeita
e noutras camas de relva e caruma fui feliz
regresso a palavras como quem mergulha
num charco púrpura onde se ouve ainda
a voz do antiquíssimo
coração.
E uccelli torniti apparvero sulla bocca dei poeti
e sulla bocca del vento tornite
le parole in fiamme
sulle bellezze del mondo e sulle altre,
quelle che furono create dall’uomo, al quale la morte
mai viene meno quando egli chiede
aiuto. Luminose parole d’agonia
che pietre cieche celebrate dal sole e dalle acque
udirono. Il mistero udirono, quello che permane
tanto in poesia quanto nel quarzo nella sua diatriba
per l’arte più ossessiva: il talento
della persistenza. Amare la vita intera.
Ed io, che fui felice ad Epidauro, a Jeita
e in altri giacigli d’erba e aghi di pino fui felice
ritorno alle parole come chi s’immerge
in una purpurea palude ove si ode ancora
la voce dell’antichissimo
cuore.
________________

Stephen Wong Chun Hei
MacLehose Trail Section 4 (2022)
...

Alguém me disse...


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Alguém me disse...
Qualcuno mi ha detto...


Alguém me disse que as aves choram
quando lhes falta o mar
por muito tempo. Não me parecem
tristes. Triste sou eu
diante das vagas
de quando fui jovem. A sombra delas na areia
tem o mesmo desenho
que meus olhos viram quando havia
paisagens. Agora,
sentado na minha rocha,
já não sei se vejo a natureza
ou se ela me vê a mim. Somos
a mesma boca, o mesmo olho obscuro
que reproduz a sombra e a sua luz.
Qualcuno mi ha detto che gli uccelli piangono
quando manca loro il mare
per molto tempo. Non mi sembrano
tristi. Triste sono io
di fronte alle onde
di quand’ero giovane. La loro ombra sulla sabbia
ha lo stesso disegno
che i miei occhi videro quando c’erano
paesaggi. Adesso,
seduto sulla mia roccia,
non so più se vedo la natura
o se è lei a vedere me. Abbiamo
la stessa bocca, lo stesso occhio oscuro
che riproduce l’ombra e la sua luce.
________________

Gianni Dova
Composizione (1971)
...

A morte é uma flor que palpita...


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A morte é uma flor que palpita...
La morte è un fiore che palpita...


A morte é uma flor que palpita
no branco da noite, um rosto antepassado
que não posso ver, um rictus terribilis
que me fascina e cega. Uma flor
distraída, pensam uns,
mas há outros que sentem o brilho
da sua navalha. Abre quando quer
o seu olho de Medusa. É
uma deusa. Acolho-me à sua sombra.
Peço ao poema que me ajude
a encontrar um sentido neste segredo
que todos bebemos
e não se esgota.
La morte è un fiore che palpita
nel bianco della notte, un volto antico
che non posso vedere, un rictus terribile
che mi affascina e acceca. Un fiore
distratto, pensano alcuni,
ma certi altri vedono il fulgore
della sua lama. Apre quando vuole
il suo sguardo di Medusa. È
una dea. Mi rifugio nella sua ombra.
Chiedo alla poesia che mi aiuti
a dare un senso a questo segreto
che tutti beviamo
e mai si esaurisce.
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Caravaggio
Scudo con testa di Medusa (1598)
...

A casa de meu avô...


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A casa de meu avô...
La casa di mio nonno...


A casa de meu avô ficou sempre
inacabada, a infância que lá vivi
também____ Os lobos do lugar,
onde já não há lobos,
mastigam a sua rosa no sangue
de outros corpos - o meu corpo não seria
uma casa, casa nenhuma
se ficasse concluído. Uma casa humilde,
mudável, interrompida
é uma espécie de poema onde o desejo de
permanecer é mais intenso
do que o desejo de pronunciar a palavra
“perfeição”: Uma coisa viva
jamais é perfeita. Em cada rosa
há um lobo que navega
onde parece não haver água
nem olhos nem coração que veja
o caminho da água.
La casa di mio nonno è sempre rimasta
incompiuta, l’infanzia che là ho vissuto
pure____ I lupi del luogo,
in cui già non ci sono più lupi,
masticano la propria rosa nel sangue
d’altri corpi - il mio corpo non sarebbe
una casa, in alcun modo una casa
se fosse stato concluso. Un’umile casa,
mutevole, sospesa
è una specie di poesia in cui il desiderio di
persistere è più intenso
del desiderio di formulare la parola
“perfezione”: Una cosa viva
non è mai perfetta. In ciascuna rosa
esiste un lupo che naviga
dove sembra che non ci sia acqua
né occhi né cuore a osservare
il cammino dell’acqua.
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Christopher Paudiss
Lupo, volpe e agnello (1666)
...

A terra perscruta o vento...


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Nuno Rocha Morais »»
 
Poesie inedite »»
nunorochamorais.blogspot.com (gennaio 2023) »»
 
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A terra perscruta o vento...
La terra ascolta il vento...


A terra perscruta o vento,
Procura entender-me,
Escolhe-me uma alma,
Quem sou? quem és?
Tantos lugares e nenhum,
Tantas formas e nenhuma,
Não me entendas, não me entendas,
Aí é a tua casa.

La terra ascolta il vento,
Si sforza di capirmi,
Mi sceglie un’anima,
Chi sono io? chi sei tu?
Tanti luoghi e nessuno,
Tante forme e nessuna,
Non capirmi, non capirmi,
Lì è la tua casa.

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Franco Azzinari
La collina del vento (2006)
...

Um homem vai na sua vida...


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Um homem vai na sua vida...
Un uomo sta andando per la sua vita...


Um homem vai na sua vida,
transporta cuidadoso a balança
do coração, e subitamente
cai. E dói, a alma
dói, os ossos
doem menos. Um homem
deita-se onde calha, uma garrafa de vinho
ajuda — deita-se num travesseiro
de palha ou nos braços do ar
e afasta-se para longe no seu corpo
cansado, e dorme, repousa
apesar de tudo____ mas a alma,
senhores, a alma não vai nisso, ela continua
a doer a doer. Um homem
enrola-se nas águas do sono
e acaba no fundo mais fundo
da mãe. Faz
escuro___ leva-se lá para dentro
a experiência do mundo e já não é
o que era, já não encontro
a paz
de quando havia uma noite
acolhedora — já não há
nada. A pedra do ar cai-me em cima
ou sou eu quem nela
pacificado cai? Dói, meus amigos,
a loba a que chamam alma
dói —
não desarma. Canto. Ou é
um pranto? Cantarei
mais fundo, mais fundo ainda, um canto
cavo
de quem regressa a casa
e já não há casa.
Un uomo sta andando per la sua vita,
con cautela trasporta la bilancia
del cuore, e tutt’a un tratto
cade. E prova dolore, l’anima
prova dolore. Le ossa
dolgono meno. Un uomo
si corica a casaccio, una bottiglia di vino
può aiutare — si sdraia su un giaciglio
di paglia o abbracciato all’aria
e se ne va lontano col suo corpo
spossato, e dorme, si rilassa
nonostante tutto____ ma l’anima,
signori miei, l’anima rimane lì, e continua
a soffrire, a soffrire. Un uomo
si crogiola nelle acque del sonno
e va a finire nel fondo più profondo
della madre. Si fa
notte___ ci si porta là dentro
l’esperienza del mondo e più non è
quel ch’era prima, più non ritrovo
quella pace
di quando lì c’era una notte
accogliente — ormai non esiste più
niente. È la pietra che dall’aria mi cade addosso
o sono io che le cado
sopra riconciliato? Fa soffrire, amici miei,
la lupa che chiamano anima
fa soffrire —
non disarma. Canto. O sto
piangendo? Canterò
più profondo, ancora più profondo, un canto
cavernoso
di chi a casa fa ritorno
e ormai non c’è più casa.
________________

Max Beckmann
Uomo che cade (1950)
...

Se o mundo não tivesse palavras...


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Se o mundo não tivesse palavras...
Se il mondo non avesse parole...


Se o mundo não tivesse palavras
a palavra do mar, com toda a sua paixão,
bastava. Não lhe falta
nada: nem o enigma nem
a obsessão. Entregue ao seu ofício
de grande hospitaleiro
o mar é um animal que se refaz
em cada momento.

O amor também. Um mar
de poucas palavras.
Se il mondo non avesse parole
la parola del mare, con tutta la sua passione,
basterebbe. Non le manca
nulla: né l’enigma né
l’ossessione. Dedito al suo mestiere
di grande anfitrione
il mare è un animale che si rinnova
ad ogni istante.

E così è l’amore. Un mare
di poche parole.
________________

Ivan Aivazonvsky
La nona onda (1850)
...

Quando me aproximo do mar...


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Quando me aproximo do mar...
Quando m’avvicino al mare...


Quando me aproximo do mar
tudo me parece aceitável.
As ondas são folhas que vão
a caminho da perfeição.
Perfeito é pois quem do tempo
 tem a longa paciência —
também a tenho quando escuto
a nervura mágica de tudo,
um tudo feito de sombras
que amaciam a pedra luminosa
que todas as coisas são.
Saltando de estação para estação
como se o caminho se fizesse,
sereno, entre o mar e o céu.
As ondas que vejo cair
também as sinto nas areias de mim
como se tudo, na barca deste mundo,
 fosse mar e luz.
Por isso a minha vida é intensa
e velha como a paciência
que não cessa de se renovar
no sangue da pedra, e das aves.
Quando m’avvicino al mare
tutto mi sembra accettabile.
Le onde sono foglie che avanzano
lungo il sentiero della perfezione.
Perfetto è infatti colui che del tempo
possiede la lunga pazienza —
anch’io la possiedo nell’ascoltare
la magica nervatura del tutto,
un tutto fatto d’ombre
che addolciscono la pietra luminosa
che è l’essenza di tutte le cose.
Saltando di stagione in stagione
come se il cammino s’aprisse,
sereno, tra il mare e il cielo.
Le onde che vedo cadere
le sento anch’io sulla mia sabbia
come se tutto, sul vascello del mondo,
fosse mare e luce.
Per questo la mia vita è intensa
e antica come la pazienza
che non cessa mai di rinnovarsi
nel sangue della pietra, e degli uccelli.
________________

Constantin Aleksandrovich
Westchiloff (1930)
...

O que faço melhor...


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O que faço melhor...
Quel che so fare meglio...


O que faço melhor é contemplar
e contemplo mal — o cristal dos meus olhos
está cansado e o sopro matinal
que tanto prazer me deu
desprende-se já do corpo
que julguei meu. Pouco a pouco,
contemplando as árvores e os seus frutos,
as aves e as suas plumas,
aprendi que não há
regresso. Ouço, palpo, não espero
nada. As nuvens navegam
brancas nos rios; as águas alimentam
fauna e flora; o gato,
caçador sentado,
assiste ao encontro adiado
das águas e da sede.
O que faço melhor é contemplar
o paraíso que vai nascendo.
Quel che so fare meglio è contemplare
e contemplo a fatica — il cristallino dei miei occhi
è stanco e il soffio mattutino
che mi dava tanto piacere
già si scinde da quel corpo
che pensavo mio. Poco a poco,
contemplando gli alberi e i loro frutti,
gli uccelli e le loro piume,
ho compreso che non vi è
ritorno. Sento, palpo, non aspetto
nulla. Le nuvole navigano
bianche sopra i fiumi; le acque alimentano
fauna e flora; il gatto,
cacciatore a riposo,
assiste all’incontro prolungato
dell’acqua e della sete.
Quel che so fare meglio è contemplare
il paradiso che sta nascendo.
________________

David Hockney
Looking towards Huggate (2019)
...

Eu não sei o que faço aqui...


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Eu não sei o que faço aqui...
Non so che ci faccio io qui...


Eu não sei o que faço aqui
sei que faço alguma coisa
pequenas coisas sem importância
às vezes aborreço-me não é grave
fico apenas um pouco mais triste
depois levanto a cabeça
os ombros vacilam
transporto uma loba mas não sei até quando
uma loba que vai deixando o pelo
na casa do poema na cave acumulada
por um sábio que não sabe nada
nem cuidar de si nem cuidar
dos homens —
aparentemente foi tudo morrendo
neste reino de pequenos casamentos
de conveniência: ficaram
a insânia sem garganta e figuras de musgo
que não conhecem a separação entre o ser
e as nuvens
as nuvens que envolvem
os caminhos do corpo
as pegadas de um vírus que não cessa de
cantar o pó, tão fácil
de soprar. Chove. A chuva
pede que me cale.
Non so che ci faccio io qui
so che faccio qualcosa
piccole cose senza importanza
se talvolta mi irrito non è grave
resto soltanto un po’ più triste
poi rialzo la testa
le spalle vacillano
trasporto una lupa ma non so fino a quando
una lupa che sta perdendo il pelo
nella casa della poesia nella cantina straripante
di un saggio che non sa nulla
né prendersi cura di sé né curarsi
degli uomini —
apparentemente tutto è andato morendo
in questo regno di piccoli matrimoni
di convenienza: sono rimasti
la demenza senza voce e figure di muschio
che non conoscono la separazione tra l’essere
e le nuvole
le nuvole che invadono
i cammini del corpo
le impronte di un virus che non cessa di
cantare la polvere, così semplice
da soffiar via. Piove. La pioggia
mi chiede di tacere.
________________

Heather Hartman
Chromaseeds (2022)
...

A contemplação da morte...


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A contemplação da morte...
La contemplazione della morte...


A contemplação da morte salva os homens,
dizia Epicuro. Ainda não sei
o que fazer, vou contemplando
os campos em volta, os vinhedos, os
moinhos e trago-te minha amiga
um ramo de orégãos — coisa melhor não tiveram
 os deuses
quando deuses houve. Orégãos
e cristais coloridos
nestas mãos que detêm o segredo
do ar bravio. Com elas te acaricio
antes que a terra me ofereça
outros tesouros. Cair assim
é uma espécie de flutuação que salva
quem não espera salvação nenhuma.
Quando os corpos se amam
eleva-se um templo invisível
onde a fúria se instala —
nem só de vinho
se embriaga um homem.
 
La contemplazione della morte salva gli uomini,
diceva Epicuro. Ancora non so
che fare, vado contemplando
i campi qui intorno, i vigneti, i
mulini e ti porto, amica mia,
un ramo d’origano — cosa migliore non avevano
 gli dei
quando c’erano gli dei. Origano
e cristalli colorati
in queste mani che celano il segreto
d’una natura rude. Con esse t’accarezzo
prima che la terra mi offra
altri tesori. Cadere così
è una specie di fluttuazione che salva
chi non s’aspetta alcun salvataggio.
Quando i corpi si amano
s’innalza un tempio invisibile
in cui s’installa la furia —
non di solo vino
s’ubriaca un uomo.
________________

Joan Miró
Bottiglia di vino (1924)
...

A alegria dos pés na terra molhada


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Animal Volátil (2002) »»
 
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A alegria dos pés na terra molhada
La gioia dei piedi sulla terra bagnata


Quando as palavras se deixam possuir
como se fossem raízes e ossos leves que trepam
à montanha
ouço a infância, o som do berlinde, a flauta
do anjo anunciador da chuva
e a formiga da mãe a enxotar-me
para a escola onde aprendi
a ler no quadro da janela
as metamorfoses do céu. A poesia escreve-se
copiando os mestres, imitando mal
as fontes naturais: as patas
da água
descendo pela serra; a melopeia silenciosa
do azeite; a boca do vento
nas telhas da velha casa 
do monte; a chama interior
dos cavalos
e dos cães da família: de manhã
pela mão do avô
eu partia de visita às árvores
e aos pássaros — esta é uma cerejeira, aquela,
a dona nogueira, olha
um picanço! a que parece muito cansada
é a figueira, Vamos comer um? O avô
pegava nele como se fosse um animalzinho
acabado de nascer, um pássaro com pétalas e já morto
na boca sedenta e logo
saciada. Um figo é uma
dádiva do sol e da terra e da nossa
humilde fome, e tudo são figos, ah não comas,
não comas nunca nada
sem fome. Ouço —
aprendi nesses dias a ouvir
o melhor da infância: água
na língua
quando a morte é gémea e se
aproxima.
Quando le parole si lasciano possedere
come se fossero radici e ossa leggere che salgono
la montagna
risento l’infanzia, il suono delle bilie, il flauto
dell’angelo che annuncia la pioggia
e la mia mamma solerte che mi sprona
ad andare a scuola dove ho imparato
a leggere nel riquadro della finestra
le metamorfosi del cielo. La poesia si scrive
copiando i maestri, imitando male
le fonti naturali: le zampe
dell’acqua
che scendono i declivi; la melopea silenziosa
dell’olio; la bocca del vento
sulle tegole della vecchia casa 
di montagna; la fiamma interiore
dei cavalli
e dei cani di famiglia: al mattino,
tenuto per mano dal nonno,
io andavo in visita agli alberi
e agli uccelli — questo è un ciliegio, quello
un signor noce, guarda
un’averla! quello che sembra molto stanco
è un albero di fico. Andiamo a mangiarne uno? Il nonno
lo coglieva come se fosse un animaletto
appena nato, un uccello coi petali e subito morto
nella bocca assetata e presto
sazia. Un fico è un
dono del sole e della terra e della nostra
umile fame, e ogni cosa è un fico, ah non mangiare,
non mangiare mai nulla
senza fame. Risento —
ho imparato in questi giorni a sentire
il meglio dell’infanzia: acqua
sulla lingua
quando la morte è gemella e si
avvicina.
________________

Berthe Morisot
Eugene Manet con la figlia in giardino (1883)
...

Se eu pudesse deixar de correr...


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Na via do mestre (2000) »»
 
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Se eu pudesse deixar de correr...
Se io potessi smettere di correre...


Se eu pudesse deixar de correr
Caminhava se eu pudesse deixar de caminhar
Sentava-me à sombra da nogueira azul do céu

Se eu pudesse deitar-me deitava-me
Numa cova com a forma do meu corpo em
Repouso se eu pudesse deixar de cantar
Fechava os olhos e olhava o alto vazio

Onde não acontece nada a não ser
A conciliação provisória do caos
E da luz que não se cansa de nascer.
Se io potessi smettere di correre
Camminerei, se io potessi smettere di camminare
Mi sederei all’ombra del grande noce blu del cielo

Se io potessi sdraiarmi mi sdraierei
In una fossa con la forma del mio corpo a
Riposo, se io potessi smettere di cantare
Chiuderei gli occhi e guarderei il vuoto supremo

Ove non accade nulla fuorché
La provvisoria conciliazione del caos
E della luce che non si stanca di nascere.
________________

Camille Pissarro
Levar del sole sul mare (1883)
...

Tu que não cabes em casa nenhuma...


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Opus afetuoso (1997) »»
 
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Tu que não cabes em casa nenhuma...
Tu che a nessuna casa appartieni...


Tu
que não cabes em casa nenhuma
tu
que vais leve como as nuvens
no outono
habitas em mim e ouço
o teu perfume a tua
respiração
nas rosas que se abrem
e dissipam
no meu poema.
Tu
che a nessuna casa appartieni
tu
che avanzi lieve come le nubi
in autunno
in me dimori ed io sento
il tuo profumo il tuo
respiro
nelle rose che sbocciano
e dilagano
nella mia poesia. 
________________

Pierre Amédée Marcel Béronneau
Orfeo (1897)
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Nuvola degli autori (e alcune opere)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant’Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (39) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (44) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (40) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (433) Pássaro de vidro (52) Poemas dos dias (23) Poemas Sociais (30) Reinaldo Ferreira (11) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)