Inquebrável


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Vida oculta (2004) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Inquebrável
Infrangibile


Dez anos? Não me peçam
memórias datadas.
Os primeiros óculos.
O mundo agora
com uma armação,
um vidro, uma distância.

Os óculos dividiam
quem os não usava
dos outros, os vidrinhos,
putos com um apêndice
tosco e visível,
putos com defeito,
com um acessório,
um gozo, a menor
traulitada os desfazia.

As minhas lentes de plástico
(assim me disseram)
eram “inquebráveis”.
Na época, ainda imaginava
matérias inquebráveis.
Como se eu, defeituoso
e afásico, fosse inquebrável.
Assim fiz a demonstração
aos basbaques e às feras,
com o dedo médio
contra o plástico
com mais força ainda,
inquebrável que era.

Aos pequenos golpes
uma lente
treme na armação
e num piparote
saltita no soalho encerado.
A troça desaba.
Como se tivesse mentindo
e fossem frágeis
lentes vulgares
que se partem como se parte
o vulgar vidro.

Só anos mais tarde soube:
o plástico inquebrável
apenas solto,
inquebrável no chão,
fora dos óculos.
Ciência tardia.
Os meus inquebráveis óculos
face à multidão
quebrados como os outros.
Nada é inquebrável
se vacilamos.
O mal acidental
fica catástrofe.
A filosofia soçobra.
Vamos, pela vida fora,
amarfanhados
num equívoco.
Dieci anni? Non pretendete
memorie datate.
I primi occhiali.
Il mondo ora ha
una montatura,
un vetro, una distanza.

Gli occhiali dividevano
chi non li usava
dagli altri, i quattr’occhi,
pivelli con un’appendice
brutta e visibile,
pivelli con un difetto,
con un accessorio,
un peso, la minima
botta li distruggeva.

Le mie lenti di plastica
(così mi dissero)
erano “infrangibili”.
All’epoca, credevo ancora
alle materie infrangibili.
Come se io, difettoso
e afasico, fossi infrangibile.
Così feci la dimostrazione
ai cretini e alle bestie,
con il dito medio
contro la plastica
con più forza ancora,
dato che ero infrangibile.

Sotto i piccoli colpi
una lente
trema nella montatura
e con una ditata
balza sul pavimento incerato.
Si scatena lo scherno.
Come se avessi mentito
e fossero fragili
lenti ordinarie
che si rompono come si rompe
il volgare vetro.

Solo anni dopo ho saputo:
la plastica è infrangibile
appena libera,
infrangibile al suolo,
fuori dagli occhiali.
Scienza tardiva.
I miei occhiali infrangibili
davanti a una moltitudine
rotti come gli altri.
Nulla è infrangibile
se vacilliamo.
Il male accidentale
diventa catastrofe.
La filosofia soccombe.
Andiamo, per la vita,
avviluppati
in un equivoco.
________________

Dora Bassi
Interno con tavolo e occhiali (2001)
...

Amável público


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Vida oculta (2004) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Amável público
Amabile pubblico


O prestidigitador (vocábulo
cesarínico e difícil) era espectacular
demais para o espectáculo,
saíam-lhe flores da vara
 
e pedia ao “amável público”
um voluntário à força
para o fazer, mágico que era,
evaporar-se numa caixa
 
e toda a infância me parece
essas toscas bancadas de circo
nas quais eu olhava para o chão
com medo de um foco de luz.
Il prestidigitatore (vocabolo
cesarinico e difficile) era spettacolare
fin troppo per lo spettacolo,
gli spuntavano fiori dalla bacchetta

e cercava fra l’ “amabile pubblico”
un volontario a forza
per farlo, da quel mago che era,
svanire in una cassa

e tutta l’infanzia mi ricorda
quelle grezze panche da circo
sulle quali io guardavo per terra
per paura d’un lampo di luce.
________________

Antonio Donghi
Il giocoliere (1936)
...

Os domingos de Lisboa


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Eliot e outras observações (2003) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Os domingos de Lisboa
Le domeniche di Lisbona


«Os domingos de Lisboa são domingos
terríveis de passar», mais terrível
este verso ter quarenta anos.

Tenho menos de quarenta, prazo
de alegrias, mas ao domingo
é p’los domingos que tenho tristeza.

Os domingos em que não soube
e se soubesse não seria diferente,
os domingos de pó e naftalina.

Os domingos sem pão e sem
correio, dia do Senhor
que morreu à sexta-feira.

Os domingos de arrumações,
de matutinos do mês passado,
da sesta hipocondríaca na cama maior.

Os domingos decrescentes,
dia em que se envelhece, missa
para os que são de missa,

futebol para os da bola,
e para as famílias almoços
em melancólicos restaurantes,

parques e lojas onde também
estou, passeando com os olhos
os filhos, saudáveis, dos outros.
«Le domeniche di Lisbona sono domeniche
terribili da passare», più terribile
è che questo verso abbia quarant’anni.

Io ne ho meno di quaranta, tempo
d’allegrie, ma la domenica,
è di domenica che mi prende la tristezza.

Le domeniche in cui non sapevo
e se avessi saputo non sarebbe diverso,
le domeniche di polvere e naftalina.

Le domeniche senza pane e senza
posta, giorno del Signore
che morì di venerdì.

Le domeniche delle pulizie,
di quotidiani del mese scorso,
della siesta ipocondriaca nel letto grande.

Le domeniche decrescenti,
giorno in cui si invecchia, messa
per quelli che vanno a messa,

football per quelli del calcio,
e per le famiglie pranzi
in malinconici ristoranti,

parchi e locali dove sosto anch’io,
accompagnando con gli occhi
i figli, adorabili, degli altri.
________________

Georges Seurat
Un bagno ad Asnières (1883-1884)
...

Sou um ponto de indefinido...


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Nuno Rocha Morais »»
 
Poemas dos dias (2022) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Sou um ponto de indefinido...
Sono un qualcosa d’indefinito...


Sou um ponto de indefinido
Situado nas encruzilhadas da alteridade,
Sou barco sem nome
Rasgado pelos cantos de emoções,
Pelas promessas de coração.
Há uma voz que me chama
Do fundo do rumo
Mas há o trânsito da confusão
Que me impede de partir
E encontrar essa voz.
Houve desde sempre demasiadas janelas,
Demasiados sóis, demasiadas ruas.
Todos os homens precisam de ter
Uma pequenez maior que o seu tamanho
Para que haja uma grandeza nos seus sonhos.
A minha grandeza é demasiado densa
Para que eu possa achar o vento da bússola.
Será a morte o meu encontrar-me?

Sono un qualcosa d’indefinito
Situato agli incroci della diversità,
Sono una barca senza nome
Raschiato dagli spigoli delle emozioni,
Dalle promesse del cuore.
C’è una voce che mi chiama
In fondo alla mia meta
Ma c’è il traffico caotico
Che m’impedisce di partire
E andare incontro a questa voce.
Ci sono sempre state troppe finestre,
Troppi soli, troppe strade.
Ogni uomo ha bisogno d’avere
Una piccolezza maggiore delle sue dimensioni
Affinché ci sia grandezza nei suoi sogni.
La mia grandezza è troppo densa
Perché io possa trovare il vento della bussola.
Sarà la morte il mio ritrovarmi?

________________

Karina Puente
Dorotea City (1972)
...

Ferro-velho


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Eliot e outras observações (2003) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Ferro-velho
Ferrovecchio


Terraços inúteis, varandas
das traseiras, arrecadações,
escadas de caracol, marquises
desbotadas, antigas estufas,
barracas, vasos partidos,
paredes abertas, telhas,
ferro-velho, andares vazios,
degraus sem uso, o fosso
do elevador, fechaduras
de portões, gatos, cadeiras,
um sol sem préstimo,
ervas daninhas, um triciclo,
humidade, silêncio, azulejos,
sábado à tarde e o meu corpo.
Terrazze inutili, verande
sul retro, sgabuzzini,
scale a chiocciola, tendoni
sbiaditi, vecchie stufe,
baracche, vasi rotti,
muri spaccati, tegole,
ferrovecchio, ballatoi vuoti,
gradini fuori uso, la tromba
dell’ascensore, fessure
di portoni, gatti, sedie,
un sole inutile,
erbacce, un triciclo,
umidità, silenzio, piastrelle,
sabato pomeriggio e il mio corpo.
________________

Le Corbusier
Natura morta purista (1920)
...

Alexandria


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Eliot e outras observações (2003) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Alexandria
Alessandria


Lisboa não é Alexandria mas
Alexandria não passa de uma metrópole
em versos subida e sublimada, a sua geometria,
as incisões do pequeno desespero.
Dêem-me uma cidade, que esta minha
está cansada e não quero outra,
escadarias em que se desce sempre,
velhas varandas apalaçadas,
dêem-me uma Alexandria do pensamento,
com uma antiguidade a dourar cada hora,
cada entardecer, mas uma antiguidade
falsa, hiperbólica,
subtil de tão imaginada, unreal city.
Lisboa não é Alexandria e está cansada, houve sítios
que conheci, outros ocultos,
percursos que adivinho no avanço
das multidões, dias de festa,
lambris de janelas, amuradas.
Não quero este rio, nem o outro,
heraclitiano, que me oferecem
umas breves obras completas na estante.
Dêem-me uma cidade terrestre, sem posteridade
ou idioma, uma cidade para que eu possa
inaugurar o passado das ruas
e, sem outro propósito, respirar. 
Lisbona non è Alessandria ma
Alessandria non è che una metropoli
innalzata ed esaltata in versi, la sua geometria,
le sue incisioni di piccole angosce.
Datemi una città, ché questa mia
è esausta e non ne voglio altra,
scalinate da cui sempre si scenda,
vecchie verande di palazzi,
datemi un’Alessandria del pensiero,
con un’antichità che indori ogni momento,
ogni serata, ma un’antichità
falsa, iperbolica,
assottigliata dalla fantasia, città irreale.
Lisbona non è Alessandria ed è stanca, c’erano
luoghi che ho conosciuto, altri occulti,
percorsi che intuisco nell’avanzare
della folla, giorni di festa,
davanzali di finestre, in muratura.
Non voglio questo fiume, né quell’altro,
eraclitiano, che mi sono offerti
in certe brevi opere complete sugli scaffali.
Datemi una città terrestre, senza posterità
o idioma, una città in cui io possa
riaprire il passato delle sue vie
e, senza altri propositi, respirare.
________________

Giuseppe Sebasti
Alessandria d'Egitto (1959)
...

Se eu pudesse...


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Avalanche (2001) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Se eu pudesse...
Se io potessi...


Se eu pudesse
ter-te em vez dos versos,
ou ter um verso
em vez de ti,
ou ter os olhos
como os de um gato
para perscrutar a noite
onde isso se decide.
Se io potessi
avere te al posto dei versi,
o avere un verso
al posto tuo,
o avere gli occhi
come quelli d’un gatto
per scrutare la notte
ove questo si decide.
________________

Victor Brauner
Gatto nero (1940)
...

Paráfrase


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Avalanche (2001) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Paráfrase
Parafrasi


Este poema começa por te comparar
com as constelações,
com os seus nomes mágicos
e desenhos precisos,
e depois
um jogo de palavras indica
que sem ti a astronomia
é uma ciência infeliz.

Em seguida, duas metáforas
introduzem o tema da luz
e dos contrastes
petrarquistas que existem
na mulher amada,
no refúgio triste da imaginação.

A segunda estrofe sugere
que a diversidade de seres vivos
prova a existência
de Deus
e a tua, ao mesmo tempo
que toma um por um
os atributos
que participam da tua natureza
e do espaço criador
do teu silêncio.

Uma hipérbole, finalmente,
diz que me fazes muita falta.
Questa poesia comincia paragonandoti
alle costellazioni,
coi loro nomi magici
e i loro disegni esatti,
e poi
un gioco di parole indica
che senza di te l’astronomia
è una scienza infelice.

Successivamente, due metafore
introducono il tema della luce
e dei contrasti
petrarcheschi che esistono
nella donna amata,
nel triste rifugio dell’immaginazione.

La seconda strofa suggerisce
che la diversità degli esseri viventi
dimostra l’esistenza
di Dio
e la tua, e insieme
elenca uno ad uno
gli attributi
che caratterizzano la tua natura
e il respiro creativo
del tuo silenzio.

Un’iperbole, infine,
dice che mi manchi tanto.
________________

Pëtr Končalovskij
Il ritratto di Puškin (1932)
...

Eu amo


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Avalanche (2001) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Eu amo
Io amo


Eu amo o teu gravador de chamadas.
Ele não me abandona
e repete vezes sem conta
a tua voz
Io amo la tua segreteria telefonica.
Lei non mi lascia mai
e ripete all’infinito
la tua voce.
________________

Christo e Jeanne-Claude
Telefono impacchettato (1962)
...

A tua biologia


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Avalanche (2001) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


A tua biologia
La tua biologia


A tua biologia mantém-me acordado
e ignorante. Sinto medo
e reverência pelos teus mistérios
sublimes e vulgares
como o sexo e o sono,

e depois lembro-me que pertences
a outro e à sua biologia
e que eu não irei nunca
dormir junto do amor
químico do teu ventre.
La tua biologia mi tiene desto
e ignorante. Provo timore
e riverenza per i tuoi misteri
sublimi e triviali
come il sesso e il sonno,

ma dopo mi rammento che appartieni
ad un altro e alla sua biologia
e che giammai io andrò
a dormire insieme all’amore
chimico del tuo ventre.
________________

Alberto Martini
Ritratto di Wally Toscanini (1925)
...

A Balada do Café Triste


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Avalanche (2001) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


A Balada do Café Triste
La Ballata del Caffè Triste


Comprei-lhe «A Balada do Café Triste»
depois de quase ter passado por ladrão
de livros, mexendo-lhes sem olhar
para eles enquanto rondava de todos
os lados aqueles olhos que se viam
de qualquer ponto da feira, mesmo
se houvesse obstáculos o verde
atravessava-os, o verde tornava tudo
verde entre mim e ela, e no meio
dessa cor unânime a rapariga
era ainda mais. Pouco importa,
leitor, se houve depois alguma história,
entre homem e mulher não se passa
muito mais: uns olhos que de repente
são necessários e pelos quais passamos
por ladrões de livros ou pior.
Nunca li «A Balada do Café Triste».
Comprai da lei «La Ballata del Caffè Triste»,
dopo aver quasi rischiato di passare per ladro
di libri, che toccavo senza guardarli
mentre accerchiavo da tutti
i lati quegli occhi che si potevano vedere
da qualunque punto della fiera, e anche
se ci fossero stati degli ostacoli quel verde
li avrebbe attraversati, quel verde rendeva tutto
verde tra me e lei, e nel mezzo
di quel colore unanime, la ragazza
risaltava ancora di più. Poco importa,
lettore, se poi la storia ebbe un seguito,
tra un uomo e una donna non succede
molto di più: occhi che all’improvviso
diventano indispensabili e davanti ai quali passiamo
per ladri di libri, se non peggio.
Non ho mai letto «La Ballata del Caffè Triste».
________________

Vincent van Gogh
Natura morta con romanzi francesi e una rosa (1887)
...

Percepção


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Em Memória (2000) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Percepção
Percezione


Entre mergulhos
uma pedra rasa salta três vezes
na água.
E assim se divide,
assim se parte
o rio. A infância
dum lado. Do outro
a terra firme
onde isto se passou.
Tra rimbalzi
una pietra piatta salta tre volte
sull’acqua.
E così si divide,
così si separa
il fiume. L’infanzia
da un lato. Dall’altro
la terraferma
dove questo è accaduto.
________________

Meg Walters
Profondo scorre il fiume (2020)
...

Memória descritiva


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Em Memória (2000) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Memória descritiva
Memoria descrittiva


A sombra dos tectos altos
não deixa respirar. A pintura
esboroada como os ossos.
A moldura verde das portas
na solidão de ferro abandonada.
Serradura nas frestas da madeira.
Gonzos, chaves, uma gaveta
com bocados e uma cama.
Luzes fugazes em jornais antigos.
Ganchos, fios, fendas.
Uma almofada, restos
dum romance francês, o metal
de um candeeiro. Recantos,
esquinas, manchas irregulares,
pratos, móveis trôpegos, uma parede
onde estala a cal. Tábuas pequenas,
traves, bolor num espelho, vidrinhos,
relógios, autocolantes, fechaduras,
uma arca da qual ninguém
se aproxima, pedaços de tecido
alegre e tantas cadeiras.
L’ombra dei soffitti alti
non lascia respirare. L’imbiancatura
sfarinata come le ossa.
L’intelaiatura verde delle porte
abbandonata in una solitudine di ferro.
Segatura nelle fessure del legno.
Cardini, chiavi, un cassetto
con delle briciole e un letto.
Luci fugaci su vecchi giornali.
Ganci, fili, crepe.
Un cuscino, spoglie
di un romanzo francese, il metallo
di un candelabro. Cantucci,
angoli, macchie irregolari,
piatti, mobili traballanti, una parete
dove la calce si screpola. Tavolini,
travi, muffa su uno specchio, flaconi,
orologi, autoadesivi, serrature,
una madia a cui nessuno
si avvicina, ritagli di un tessuto
allegro e tante sedie.
________________

Vassily Kandinsky
La mia sala da pranzo (1909)
...

Homens sem mulheres


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Em Memória (2000) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Homens sem mulheres
Uomini senza donne


Durante meses ou anos (ou,
em todo o caso, um múltiplo
de semanas) trazia debaixo
do braço, com os livros da lei,
Men Without Women,
de Ernest Hemingway.
Hábito exterior de mostrar
leituras ou de passear,
como legendas, frases sintéticas
e duras, não o tolerava
nos outros, mas só em mim,
na minha edição velha
e laranja da Penguin.
Eu não queria que o livro
terminasse, e o plural
do título era um disfarce.
Nel corso di mesi o anni (o,
comunque, un multiplo di
settimane) mi sono portato sotto
il braccio, insieme ai libri di legge,
Men Without Women,
di Ernest Hemingway.
Superficiale abitudine di esibire
letture o di andare a spasso,
come didascalie, frasi sintetiche
e dure, non lo sopportavo
negli altri, ma in me soltanto,
nella mia edizione vetusta
e arancione della Penguin.
Io non volevo che il libro
finisse e il plurale
del titolo era una messinscena.
________________

Copertina di Men Without Women
di Ernest Hemingway (Penguin Books)
...

Ao crepúsculo...


Nome:
 
Collezione:
Fonte:
 
Altra traduzione:
Nuno Rocha Morais »»
 
Poesie inedite »»
nunorochamorais.blogspot.com (luglio 2024) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Ao crepúsculo...
Al crepuscolo...


Ao crepúsculo, as casas empalidecem,
Preparando-se para a longa travessia da noite,
Despedem-se com os últimos fulgores das vidraças do sol.
Registo coralífero à luz moribunda,
As casas crescem agora por dentro,
Agitam-se de vozes e crianças,
São inundadas por odores,
Abrem as paredes à lembrança.
Que vidas escondem?
As casas tudo calam,
Libertando, quando consentido,
Monossílabos de janelas abertas ou portas
Ou roupas dispostas ao calor.
São assim as casas, fiéis,
Calorosos túmulos da vida.
Al crepuscolo, le case impallidiscono,
Disponendosi alla lunga traversata della notte,
Si dileguano con gli ultimi fulgori delle vetrate del sole.
Registro corallifero nella morente luce,
Ora le case crescono all’interno,
Si movimentano di voci e di bambini
Sono inondate di effluvi,
Aprono le pareti al ricordo.
Che vite nascondono?
Le case tutto celano,
Esternando, quando consentito,
Monosillabi di finestre aperte o di porte
O d’indumenti sistemati al caldo.
Sono così le case, fedeli,
Calorosi avelli della vita.
________________

Egon Schiele
Sole al tramonto (1913)
...

Funerais


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Pedro Mexia »»
 
Em Memória (2000) »»
 
Francese »»
«« precedente / Sommario / successivo »»
________________


Funerais
Funerali


Nos funerais encontramos a família.
Nunca fomos tão claros
como no luto
e nas memórias anedóticas
que amenizam o morto.
Que sangue é o teu
para que o meu se assemelhe?
Alguns velhos trazem flores
que já ofereceram nos casamentos
e entre eles decidem
que somos uma família,
conhecem os primos que não
conheço, lamentam a sorte
daqueles cuja sorte é conhecida,
são ainda mais graves
do que nós, e usam
diminutivos carinhosos.
O meu nome far-se-á pó
com o meu corpo, pensa
uma mulher que já é viúva,
há irmãos completamente mudos
e as crianças jogam à cabra-cega.
Seguimos em cortejo
compondo as gravatas,
o vento não percebe que morreu gente.
Dez pessoas acompanham o padre,
os outros já não se lembram
das orações,
dez pessoas pensam
no que têm pela frente,
os outros acompanham o caixão.
O coveiro mais novo
dentro de pouco tempo
enterrará o mais velho.
Ai funerali incontriamo la famiglia.
Mai siamo stati così trasparenti
come nel lutto
e nelle memorie aneddotiche
che ravvivano il morto.
Che tipo di sangue è il tuo
perché il mio sia simile?
Qualche vecchio porta dei fiori,
gli stessi già donati ai matrimoni,
e decidono tra loro
che siamo una famiglia,
conoscono i cugini che io non
conosco, compiangono la sorte
di quella la cui sorte è nota,
sono ancora più seri
di noi, e usano
diminutivi affettuosi.
Il mio nome tornerà alla polvere
con il mio corpo, pensa
una donna che è già vedova,
ci sono fratelli completamente muti
e i bambini giocano a mosca cieca.
Seguiamo il corteo
aggiustando le cravatte,
il vento non capisce che qualcuno è morto.
Dieci persone accompagnano il prete,
gli altri non ricordano già più
le preghiere,
dieci persone pensano
a quello che li aspetta,
gli altri seguono la bara.
Il più giovane dei becchini
tra breve tempo
sotterrerà il più vecchio.
________________

André Derain
Funerale (1899)
...

Nuvola degli autori (e alcune opere)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant’Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (39) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (109) Casimiro de Brito (40) Cassiano Ricardo (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (47) Hilda Hilst (41) Iacyr Anderson Freitas (37) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (44) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (40) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (454) Pássaro de vidro (52) Pedro Mexia (40) Poemas dos dias (24) Poemas Sociais (30) Reinaldo Ferreira (40) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)