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Dentro da noite veloz
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Dentro la notte veloce
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I
Na quebrada do Yuro
eram 13,30 horas
(em São Paulo
era mais tarde; em Paris anoitecera;
na Ásia o sono era seda)
Na quebrada do rio Yuro
a claridade da hora
mostrava seu fundo escuro:
as águas limpas batiam
sem passado e sem futuro.
Estalo de mato, pio
de ave, brisa
nas folhas
era silêncio o barulho
a paisagem
(que se move)
está imóvel, se move
dentro de si
(igual que uma máquina de lavar
lavando
sob o céu boliviano, a paisagem
com suas polias e correntes
de ar)
Na quebrada do Yuro
não era hora nenhuma
só pedras plantas e águas
II
Não era hora nenhuma
até que um tiro
explode em pássaros
e animais
até que passos
vozes na água rosto nas folhas
peito ofegando
a clorofila
penetra o sangue humano
e a história
se move
a paisagem
como um trem
começa a andar
Na quebrada do Yuro eram 13,30 horas
III
teu fim está perto
não basta estar certo
para vencer a batalha
Ernesto Che Guevara
Entrega-te à prisão
não basta ter razão
pra não morrer de bala
Ernesto Che Guevara
não estejas iludido
a bala entra em teu corpo
como em qualquer bandido
Ernesto Che Guevara
por que lutas ainda?
a batalha está finda
antes que o dia acabe
Ernesto Che Guevara
é chegada a tua hora
e o povo ignora
se por ele lutavas
IV
Correm as águas do Yuro, o tiroteio agora
é mais intenso, o inimigo avança
e fecha o cerco.
Os guerrilheiros
em grupos pequenos divididos
agüentam
a luta, protegem a retirada
dos companheiros feridos.
No alto,
grandes massas de nuvens se deslocam lentamente
sobrevoando países
em direção ao Pacífico, de cabeleira azul.
Uma greve em Santiago. Chove
na Jamaica. Em Buenos Aires há sol
nas alamedas arborizadas, um general maquina um golpe.
Uma família festeja bodas de prata num trem que se aproxima
de Montevidéu. À beira da estrada
muge um boi da Swift. A Bolsa
no Rio fecha em alta
ou baixa.
Inti Peredo, Benigno, Urbano, Eustáquio, Ñato
castigam o avanço
dos rangers.
Urbano tomba,
Eustáquio
Guevara sustenta
o fogo, uma rajada o atinge, atira ainda, solve-se-lhe
o joelho, no espanto
os companheiros voltam
para apanhá-lo. É tarde. Fogem.
A noite veloz se fecha sobre o rosto dos mortos.
V
Num helicóptero iangue
é levado para Higuera
onde a morte o espera
Não morrerá das feridas
ganhas no combate
mas de mão assassina
que o abate
Não morrerá das feridas
ganhas a céu aberto
mas de um golpe escondido
ao nascer do dia
Assim o levam pra morte
(sujo de terra e de sangue)
subjugado no bojo
de um helicóptero ianque
É o seu último vôo
sobre a América Latina
sob o fulgor das estrelas
que nada sabem dos homens
que nada sabem do sonho,
da esperança, da alegria,
da luta surda do homem
pela flor da cada dia
É o seu último vôo
sobre a choupana de homens
que não sabem o que se passa
naquela noite de outubro
quem passa sobre seu teto
dentro daquele barulho
quem é levado pra morte
naquela noite noturna
VI
A noite é mais veloz nos trópicos
(com seus . . na vertigem das folhas na explosão
(monturos) . . das águas sujas
surdas
nos pantanais
é mais veloz sob a pele da treva, na
conspiração de azuis
e vermelhos pulsando
como vaginas frutas bocas
vegetais
(confundidos nos sonhos)
ou
um ramo florido feito um relâmpago
parado sobre uma cisterna d´água
no escuro
É mais funda
a noite no sono
do homem na sua carne
de coca
e de fome
e dentro do pote uma caneca
de lata velha de ervilha
da Armour Company
A noite é mais veloz nos trópicos
com seus monturos
e cassinos de jogos
entre as pernas das putas
o assalto
a mão armada
aberta em sangue a vida.
É mais veloz
(e mais demorada)
nos cárceres
a noite latino-americana
entre interrogatórios
e torturas
(lá fora as violetas)
e mais violenta (a noite)
na cona da ditadura
Sob a pele da treva, os frutos
crescem
conspira o açúcar
(de boca para baixo) debaixo
das pedras, debaixo
da palavra escrita no muro
ABAIX
e inacabada
Ó Tlalhuicole
as vozes soterradas da platina
Das plumas que ondularam já não resta
mais que a lembrança
no vento
Mas é o dia (com
seus monturos)
pulsando
dentro do chão
como um pulso
apesar da South American Gold and Platinum
é a língua do dia
no azinhavre
Golpeábamos en tanto los muros de adobe
y era nuestra herencia una red de agujeros
é a língua do homem
sob a noite
no leprosário de San Pablo
nas ruínas de Tiahuanaco
nas galerias de chumbo e silicose
da Cerro de Pasco Corporation
Hemos comido grama salitrosa
piedras de adobe lagartijas ratones
tierra en polvo y gusanos
até que o dia
(de dentro dos monturos) irrompa
com seu bastão turquesa
VII
Súbito vimos ao mundo
E nos chamamos Ernesto
Súbito vimos ao mundo
e estamos
na América Latina
Mas a vida onde está?
nos perguntamos
Nas tavernas?
nas eternas
tardes tardas?
nas favelas
onde a história fede a merda?
no cinema?
na fêmea caverna de sonhos
e de urina?
ou na ingrata
faina do poema?
(a vida
que se esvai
no estuário do Prata)
Serei cantor
serei poeta?
Responde o cobre (da Anaconda Copper):
Serás assaltante
e proxeneta
policial jagunço alcagueta
Serei pederasta e homicida?
serei viciado?
Responde o ferro (da Bethlehem Steel):
Serás ministro de Estado
e suicida
Serei dentista?
talvez quem sabe oftalmologista?
otorrinolaringologista?
Responde a bauxita (da Kaiser Aluminium):
serás médico aborteiro
que dá mais dinheiro
Serei um merda
quero ser um merda
Quero de fato viver.
Mas onde está essa imunda
vida – mesmo imunda?
No hospício?
num santo
ofício?
no orifício
da bunda?
Devo mudar o mundo,
a República? A vida
terei de plantá-la
como um estandarte
em praça pública?
VIII
A vida muda como a cor dos frutos
lentamente
e para sempre
A vida muda como a flor em fruto
velozmente
A vida muda como a água em folhas
o sonho em luz elétrica
a rosa desembrulha do carbono
o pássaro da boca
mas
quando for tempo
E é tempo todo o tempo
mas
não basta um século para fazer a pétala
que um só minuto faz
ou não
mas
a vida muda
a vida muda o morto em multidão.
I
Nella gola del Yuro
erano le 13 e 30
(a San Paolo
era più tardi; a Parigi faceva notte;
in Asia il sonno era di seta)
Nella gola del fiume Yuro
la nitidezza dell’ora
rivelava il suo fondo scuro:
turbinavano le limpide acque
senza passato e senza futuro.
Schianto di tronchi, pigolio
d’uccello, brezza
tra le foglie
era silenzio il rumore
il paesaggio
(che si muove)
è immobile, è dentro di sé
che si muove
(proprio come una lavatrice
quando lava
sotto il cielo boliviano, il paesaggio
con le sue pulegge e correnti
d’aria)
Nella gola del Yuro
non c’era nessuna ora
solo pietre piante e acque
II
Non c’era nessuna ora
finché un tiro
esplode tra uccelli
e animali
finché dei passi
delle voci sull’acqua un volto tra le foglie
un petto ansimante
la clorofilla
penetra il sangue umano
e la storia
si mette in moto
il paesaggio
come un treno
comincia a camminare
Nella gola del Yuro erano le 13,30
III
la tua fine è imminente
esser nel giusto non è sufficiente
per vincere la battaglia
Ernesto Che Guevara
consegnati alla prigione
non basta aver ragione
per non farsi sparare
Ernesto Che Guevara
non devi farti illudere
la palla t’entrerà nel corpo
come in qualunque criminale
Ernesto Che Guevara
perché tu lotti ancora?
la battaglia andrà in malora
prima che il giorno muoia
Ernesto Che Guevara
è giunta la tua ora
eppure il popolo ignora
che per lui tu lottavi
IV
Corrono le acque del Yuro, la sparatoria
s’è fatta ora più intensa, il nemico avanza
e il cerchio si chiude.
I guerriglieri
in piccoli gruppi separati
resistono
alla lotta, proteggono la ritirata
dei compagni feriti.
Lassù,
grandi masse di nuvole si spostano lentamente
sorvolando paesi
dirette verso il Pacifico, con la sua chioma blu.
Uno sciopero a Santiago. Piove
sulla Giamaica. A Buenos Aires c’è il sole
sui viali alberati, un generale ordisce un golpe.
Una famiglia festeggia nozze d’argento su un treno che si dirige
a Montevideo. Sul ciglio della strada
muggisce un bue della Swift. La Borsa
a Rio chiude al rialzo
o al ribasso.
Inti Peredo, Benigno, Urbano, Eustáquio, Ñato
contengono l’avanzata
del rangers.
Urbano cade,
poi Eustáquio
Guevara resiste
al fuoco, una raffica lo raggiunge, tira ancora, gli si
sfracella il ginocchio, atterriti
i compagni tornano
a prenderlo. È tardi. Fuggono.
La notte veloce si richiude sui volti dei morti.
V
In un elicottero yankee
viene portato a Higuera
dove la morte è in attesa
Non morirà per le ferite
ricevute nella lotta
ma per la mano assassina
che lo abbatterà
Non morirà per le ferite
ricevute a cielo aperto
ma per un colpo inferto
sul nascere del giorno
Lo portano così alla morte
(sporco di terra e sangue)
legato sotto il ventre
d’un elicottero yankee
È il suo ultimo volo
sopra l’America Latina
sotto il fulgore delle stelle
che nulla sanno degli uomini
che nulla sanno del sogno,
della speranza, del gaudio,
della tacita lotta dell’uomo
per il fiore quotidiano
È il suo ultimo volo
sopra le capanne degli uomini
che non sanno chi sta passando
in questa notte d’ottobre
chi passa sui loro tetti
dentro quel gran frastuono
chi è portato a morire
in quella notte arcana
VI
La notte è più veloce ai tropici
(col suo . . . nella vertigine delle foglie nell’esplosione
(lerciume) . . delle acque sordide
sorde
nelle paludi
è più veloce sotto la pelle delle tenebre, nella
cospirazione di blu
e rossi pulsanti
come vagine frutti bocche
vegetali
(mescolati ai sogni)
o
come un ramo fiorito in un baleno
fermo sopra una cisterna d’acqua
al buio
È più profonda
la notte nel sonno
dell’uomo nella sua carne
tormentata di coca
e di fame
nel bacile da dove beve con
una vecchia lattina di piselli
della Armour Company
La notte è più veloce ai tropici
col suo lerciume
e le sale da gioco
tra le gambe delle puttane
e l’assalto
a mano armata
stringe a sangue la vita.
È più veloce
(e più prolungata)
nelle carceri
la notte latino-americana
tra interrogatori
e torture
(là fuori le violette)
e più violenta (la notte)
nella pancia della dittatura
Sotto la pelle delle tenebre, i frutti
crescono
cospira lo zucchero
(a sussurri) sotto
le pietre, sotto
la parola scritta sul muro
ABBAS
e incompleta
O'Tlalhuicole
le voci sotterranee del platino
Delle piume ondeggianti più non resta
che il ricordo
nel vento
Ma è il giorno (con
il suo lerciume)
che pulsa
dentro il suolo
come un polso
benché quella della South American Gold and Platinum
sia la lingua del giorno
sotto il verderame
Golpeábamos en tanto los muros de adobe
y era nuestra herencia una red de agujeros
è la lingua dell’uomo
nella notte
nel lebbrosario di San Pablo
tra le rovine di Tiahuanaco
nelle miniere di piombo e silicosi
della Cerro de Pasco Corporation
Hemos comido grama salitrosa
piedras de adobe lagartijas ratones
tierra en polvo y gusanos
finché il giorno
(dentro il suo lerciume) irrompe
con le sue mazzate turchesi
VII
D’un tratto veniamo al mondo
E ci chiamiamo Ernesto
D’un tratto veniamo al mondo
e ci troviamo
in America Latina
Ma la vita dov’è?
ci chiediamo
Nelle taverne?
nelle serate
eternamente tarde?
nelle favelas
dove la storia puzza di merda?
al cinema?
nell’antro muliebre di sogni
e d’urina?
o nell’ingrata
fatica della poesia?
(la vita
che svanisce
nell’estuario del Rio de la Plata)
Sarò cantore
sarò poeta?
Risponde il rame (dell’Anaconda Copper):
Tu sarai brigante
e prosseneta
poliziotto guardaspalle delatore
Sarò pederasta e omicida?
sarò drogato?
Risponde il ferro (della Bethlehem Steel):
Sarai ministro di Stato
e finirai suicida
Sarò dentista?
forse chissà oftalmologo?
otorinolaringoiatra?
Risponde la bauxite (della Kaiser Aluminium):
sarai medico abortista
che rende più denaro
Sarò una merda
voglio essere una merda
Voglio davvero vivere
Ma dov’è questa immonda
vita – proprio immonda?
All’ospizio?
in un santo
uffizio?
nell’orifizio
del culo?
Devo cambiare il mondo,
la Repubblica? La vita
dovrò piantarla
come uno stendardo
sulla piazza pubblica?
VIII
La vita cambia come il colore dei frutti
lentamente
e per sempre
La vita cambia come il fiore in frutto
velocemente
La vita cambia come l’acqua in foglie
il sogno in luce elettrica
la rosa discende dal carbonio
l’uccello dalla bocca
ma
quando sarà tempo
E tutto il tempo è tempo
ma
non serve un secolo per far nascere un petalo
ché un solo minuto lo può fare
o no
ma
la vita cambia
la vita tramuta il morto in moltitudine.
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Roberto Matta I poteri del disordine (1964) |
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