Eu fecho os olhos e vejo a casa...


Nome:
 
Collezione:
 
Altra traduzione:
Gilberto Nable »»
 
Percurso da Ausência (2006) »»
 
Francese »»
«« precedente /  Sommario / successivo »»
________________


Eu fecho os olhos e vejo a casa...
Io chiudo gli occhi e vedo la casa...


  Provera que eu, nesta casa, não entrasse,
  Feita que é, toda ela, de prestígio e solidão.
  Dantas Mota “Elegias do País das Gerais”

Eu fecho os olhos e vejo a casa
suspensa no ar feito um navio.
Ancorada na memória ela flutua,
quase sem náusea, ruído ou marulho.
Na horta o luar ainda ilumina as couves,
os pés de funchos, desde minha avó.
Cortadas as amarras elétricas, os telefones,
esta é uma nave escura e silenciosa.
Empreenderá uma longa viagem,
ou somente se apressa para o naufrágio?

Não espanaram o pó das cadeiras,
nem estenderam toalhas na sala,
e mesmo assim os filhos se reúnem,
no exato lugar onde a velaram:
Testamento, partilha e espólio.
Então, é preciso inventariar tudo:
o quanto de lágrimas vertidas,
a agonia e as ampolas de morfina,
os bens móveis e os bens imóveis,
o guarda-roupas e as poucas jóias.

Mas no cofre nada procurem.
Embora preciosas, só cartas e lembranças.
Porque esta é a ironia das exéquias,
e a impropriedade dos inventários:
o bem mais valioso quem o herda?
Quem acumulou mais ternura ou discórdia?
Da partilha, a mim, coube a dor mais funda,
e o sentido da privação e do mistério.
Das vigias tristes deste navio,
me observa uma lua opaca.

Desço as escadas pensativo,
e visito a coleção inusitada das coisas,
que durante a vida minha mãe recolheu:
retratos dos filhos, dos pais, dos avós,
aprisionados em velhas molduras;
tachos, santos, troféus, baús,
um moedor de café, um grande tijolo
com a data gravada: 1885.
E a presença dela se fragmenta
em perdidas ressonâncias de museu.

No jardim inventario as rosas,
as dálias, violetas e orquídeas,
as dezenas de jarros floridos.
Os pés delicados de lírios,
cuidados com tanto carinho.
Mas as mãos dela sumiram,
esquecidas de pétalas e raízes.
E pouco a pouco os canteiros,
ficarão também esquecidos,
pois tudo é esquecimento e olvido.

  Meglio che io, in questa casa, non entrassi,
  Fatta com’è, tutta d’incanto e solitudine.
  Dantas Mota “Elegias do País das Gerais”

Io chiudo gli occhi e vedo la casa
sospesa in aria come una nave.
Ancorata alla memoria fluttua,
quasi senza nausea, rumore o sciabordio.
Nell’orto il chiar di luna illumina i cavoli,
le piante di finocchi, dai tempi di mia nonna.
Tagliati gli allacci elettrici, i telefoni,
questa è una nave scura e silenziosa.
S’accinge ad affrontare un lungo viaggio,
o s’affretta soltanto verso il naufragio?

Non han tolto la polvere dalle sedie,
né hanno steso tovaglie nella sala,
malgrado ciò i figli si riuniscono,
nel posto stesso in cui la vegliarono:
Testamento, spartizione e spoglio.
Dunque, bisogna inventariare tutto:
la quantità di lacrime versate,
l’agonia e le fiale di morfina,
i beni mobili e i beni immobili,
il guardaroba e i pochi gioielli.

Ma nel forziere non cercate nulla.
Benché preziose, solo lettere e ricordi.
Perché questa è l’ironia delle esequie,
e l’imprecisione degli inventari:
il bene più prezioso chi l’eredita?
Chi ha accumulato più tenerezza o discordia?
Della spartizione, a me, spetta il dolore più profondo,
e la sensazione di privazione e di mistero.
Dai tristi oblò di questa nave,
mi osserva una luna opaca.

Scendo le scale pensieroso,
e visito l’inconsueta collezione delle cose,
che mia madre ha raccolto in vita:
ritratti dei figli, dei genitori, dei nonni,
imprigionati in vecchie cornici;
vasi, santi, trofei, bauli,
un macinacaffè, un grande mattone
con la data incisa: 1885.
E la sua presenza si frammenta
in perdute risonanze da museo.

In giardino inventario le rose,
le dalie, le violette e le orchidee,
le decine di vasi fioriti.
Le delicate piantine di giglio,
curate con tante premure.
Ma le sue mani sparirono,
dimentiche di petali e radici.
E a poco a poco le aiuole,
verranno a loro volta scordate,
perché tutto è dimenticanza e oblio.

________________

Carl Vilhelm Holsoe
Interno con giardino (1920)
...

Nessun commento:

Posta un commento

Nuvola degli autori (e alcune opere)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant’Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (39) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (107) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (44) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (40) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (434) Pássaro de vidro (52) Poemas dos dias (23) Poemas Sociais (30) Reinaldo Ferreira (18) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)