Eu fecho os olhos e vejo a casa...


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Eu fecho os olhos e vejo a casa...
Io chiudo gli occhi e vedo la casa...


  Provera que eu, nesta casa, não entrasse,
  Feita que é, toda ela, de prestígio e solidão.
  Dantas Mota “Elegias do País das Gerais”

Eu fecho os olhos e vejo a casa
suspensa no ar feito um navio.
Ancorada na memória ela flutua,
quase sem náusea, ruído ou marulho.
Na horta o luar ainda ilumina as couves,
os pés de funchos, desde minha avó.
Cortadas as amarras elétricas, os telefones,
esta é uma nave escura e silenciosa.
Empreenderá uma longa viagem,
ou somente se apressa para o naufrágio?

Não espanaram o pó das cadeiras,
nem estenderam toalhas na sala,
e mesmo assim os filhos se reúnem,
no exato lugar onde a velaram:
Testamento, partilha e espólio.
Então, é preciso inventariar tudo:
o quanto de lágrimas vertidas,
a agonia e as ampolas de morfina,
os bens móveis e os bens imóveis,
o guarda-roupas e as poucas jóias.

Mas no cofre nada procurem.
Embora preciosas, só cartas e lembranças.
Porque esta é a ironia das exéquias,
e a impropriedade dos inventários:
o bem mais valioso quem o herda?
Quem acumulou mais ternura ou discórdia?
Da partilha, a mim, coube a dor mais funda,
e o sentido da privação e do mistério.
Das vigias tristes deste navio,
me observa uma lua opaca.

Desço as escadas pensativo,
e visito a coleção inusitada das coisas,
que durante a vida minha mãe recolheu:
retratos dos filhos, dos pais, dos avós,
aprisionados em velhas molduras;
tachos, santos, troféus, baús,
um moedor de café, um grande tijolo
com a data gravada: 1885.
E a presença dela se fragmenta
em perdidas ressonâncias de museu.

No jardim inventario as rosas,
as dálias, violetas e orquídeas,
as dezenas de jarros floridos.
Os pés delicados de lírios,
cuidados com tanto carinho.
Mas as mãos dela sumiram,
esquecidas de pétalas e raízes.
E pouco a pouco os canteiros,
ficarão também esquecidos,
pois tudo é esquecimento e olvido.

  Meglio che io, in questa casa, non entrassi,
  Fatta com’è, tutta d’incanto e solitudine.
  Dantas Mota “Elegias do País das Gerais”

Io chiudo gli occhi e vedo la casa
sospesa in aria come una nave.
Ancorata alla memoria fluttua,
quasi senza nausea, rumore o sciabordio.
Nell’orto il chiar di luna illumina i cavoli,
le piante di finocchi, dai tempi di mia nonna.
Tagliati gli allacci elettrici, i telefoni,
questa è una nave scura e silenziosa.
S’accinge ad affrontare un lungo viaggio,
o s’affretta soltanto verso il naufragio?

Non han tolto la polvere dalle sedie,
né hanno steso tovaglie nella sala,
malgrado ciò i figli si riuniscono,
nel posto stesso in cui la vegliarono:
Testamento, spartizione e spoglio.
Dunque, bisogna inventariare tutto:
la quantità di lacrime versate,
l’agonia e le fiale di morfina,
i beni mobili e i beni immobili,
il guardaroba e i pochi gioielli.

Ma nel forziere non cercate nulla.
Benché preziose, solo lettere e ricordi.
Perché questa è l’ironia delle esequie,
e l’imprecisione degli inventari:
il bene più prezioso chi l’eredita?
Chi ha accumulato più tenerezza o discordia?
Della spartizione, a me, spetta il dolore più profondo,
e la sensazione di privazione e di mistero.
Dai tristi oblò di questa nave,
mi osserva una luna opaca.

Scendo le scale pensieroso,
e visito l’inconsueta collezione delle cose,
che mia madre ha raccolto in vita:
ritratti dei figli, dei genitori, dei nonni,
imprigionati in vecchie cornici;
vasi, santi, trofei, bauli,
un macinacaffè, un grande mattone
con la data incisa: 1885.
E la sua presenza si frammenta
in perdute risonanze da museo.

In giardino inventario le rose,
le dalie, le violette e le orchidee,
le decine di vasi fioriti.
Le delicate piantine di giglio,
curate con tante premure.
Ma le sue mani sparirono,
dimentiche di petali e radici.
E a poco a poco le aiuole,
verranno a loro volta scordate,
perché tutto è dimenticanza e oblio.

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Carl Vilhelm Holsoe
Interno con giardino (1920)
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