Chopin: Um inventário


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Chopin: Um inventário
Chopin: Un inventario


Quase sessenta mazurcas; cerca de trinta estudos;
duas dúzias de prelúdios; uma vintena de nocturnos;
umas quinze valsas; mais de uma dúzia de “polonaises”;
“scherzos”, improvisos, e baladas, quatro de cada;
três sonatas para piano; e dois concertos para piano
 e orquestra,
uma “berceuse”, uma barcarola, uma fantasia, uma
 tarantela, etc.,
além de umas dezassete canções para canto e piano; uma
 tuberculose mortal;
um talento de concertista; muitos sucessos mundanos; uma
 paixão infeliz;
uma ligação célebre com mulher ilustre; outras ligações
 sortidas;
uma pátria sem fronteiras seguras nem independência
 concreta;
a Europa francesa do Romantismo; várias amizades com
 homens eminentes;
e apenas trinta e nove anos de vida. Outros viveram menos,
 escreveram mais,
comeram mais amargo o classicamente amargo pão do
 exílio, foram ignorados
ou combatidos, morreram abandonados, não se passearam
 nas alcovas
ou nos salões da glória, confinaram-se menos ao
 instrumento que melhor dominavam,
e mesmo foram mais apátridas sofrendo de uma pátria que
 não haja.
Além disso, quase todos escaparam mais à possibilidade
 repelente
de ser melodia das virgens, ritmo dos castrados,
requebro de meia-tijela, nostalgia dos analfabetos,
e outras coisas medíocres e mesquinhas da vulgaridade,
 como ele não. Ou de ser
prato de não-resistência para os concertistas que tocam
 para as pessoas que julgam
que gostam de música mas não gostam. Ainda por cima
era um arrivista, um pedante convencido da aristocracia que
 não tinha,
um reaccionário ansiando por revoluções que libertassem
 as oligarquias
da Polónia, coitadinhas, e outras. E, para cúmulo,
a gente começa a desconfiar de que não era sequer
 um romântico,
pelo menos da maneira que ele fingiu ser e deixou entender
 que era.
Uma arte de compor a música como quem escreve
 um poema,
a força que se disfarça em languidez, um ar de inspiração
ocultando a estrutura, uma melancolia harmónica por sobre
a ironia melódica (ou o contrário), a magia dos ritmos
usada para esconder o pensamento – e escondê-lo tanto,
que ainda passa por burro de génio este homem que tinha
 o pensamento nos dedos,
e cuja audácia usava a máscara do sentimento ou das
 formas livres
para criar-se a si mesmo. Tão hábil na sua cozinha, que
 pode servir-se
morno, às horas da saudade e da amargura,
quente, nas grandes ocasiões da vida triunfal,
e frio, quando só a música dirá o desespero vácuo
de ser-se piano e nada mais no mundo.

Quasi sessanta mazurche; circa trenta studi;
due dozzine di preludi; una ventina di notturni;
sui quindici valzer; più di una dozzina di “polacche”;
scherzi, improvvisi, ballate, quattro di ciascuno;
tre sonate per piano; e due concerti per piano
 e orchestra,
una “berceuse”, una barcarola, una fantasia, una
 tarantella ecc.,
oltre a diciassette canzoni per voce e piano; una
 tubercolosi mortale;
un talento da concertista; molti successi mondani; una
 passione infelice;
una celebre relazione con una donna famosa; altre
 relazioni assortite;
una patria senza confini sicuri né un’indipendenza
 concreta;
l’Europa francese del Romanticismo; varie amicizie con
 uomini di prestigio;
e trent’anni scarsi di vita. Altri vissero meno, scrissero
 di più,
masticarono più amaramente il classico pane amaro
 dell’esilio, furono ignorati
o perseguitati, morirono abbandonati, non indugiarono
 tra le alcove
o nei saloni della gloria, si isolarono meno con lo strumento
 che meglio dominavano,
eppure furono più sradicati, soffrendo per una patria che
 non esisteva.
E inoltre, quasi tutti sfuggirono alla ripugnante
 possibilità
d’essere la melodia delle vergini, o il ritmo dei castrati,
leziosità per le mezze calzette, nostalgia per gli analfabeti,
e altre cose volgari, mediocri e meschine – cose cui egli
 non sfuggì. O d’essere
il piatto insipido per i concertisti che suonano per quelli
 che credono
d’amare la musica senza amarla davvero. E soprattutto,
era un arrivista, un pedante imbevuto di un’aristocrazia che
 non possedeva,
un reazionario smaniante per rivoluzioni che liberassero
 le oligarchie
della Polonia, poverine, e anche le altre. E, per finire,
qualcuno comincia a sospettare che non fosse nemmeno
 un romantico,
per lo meno del genere che egli finse d’essere e lasciò
 intendere d’essere.
Una capacità di comporre musica come se scrivesse
 una poesia,
la forza camuffata da languore, un’aria ispirata
che occulta la struttura, una malinconia armonica sopra
l’ironia melodica (o tutto il contrario), la magia dei ritmi
usata per nascondere il pensiero – e nasconderlo al punto
che riesce anche a passare per asino di genio quest’uomo
 che pensava con le dita,
e la cui audacia usava la maschera del sentimento o
 di forme libere
per creare se stesso. Tanto abile nella sua cucina, da poter
 essere servito
tiepido, nelle ore del rimpianto e della pena,
caldo, nelle grandi occasioni della vita trionfante,
o freddo, quando solo la musica dirà il vacuo tormento
d’essere solamente piano e nulla più al mondo.

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Henryk Siemiradzki
Chopin suona il piano per il Principe Radziwill (1887)
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