os mortos na casa da memória


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os mortos na casa da memória
i morti nella casa della memoria


  aos meus ancestrais

na casa da memória
os mortos estão vivos
como a velha e frondosa
jabuticabeira no quintal

— é a árvore de nossa estirpe!
me dizem eles sem que eu pergunte
estão vivos eles vivos
nesta estranha fotografia
ausente e lívida em si mesma
e me olham e me ouvem
e me são e me seguem e me dizem tudo
do fundo de seu sonoro silêncio
movem-se parados, flutuam
em si mesmos os mortos
que habitam a casa
com trajes de época
— chapéus, ternos, bengalas
e longos vestidos rodados
estão dentro do invisível
e da matéria do tempo
ao meu lado — e no infinito
quantos anos tem mesmo esta
casa? Uns cento e cinquenta anos?
e a outra casa, dentro desta?

seu aroma forte e antigo
de madeiras nobres, suas
paredes caiadas de branco
suas imensas janelas e portas
abrindo para os cafezais verdes
(quando meu avô aqui chegou
ainda bem novo a casa já era velha
e à noite as panteras em bandos
arranhavam estas portas e janelas
famintas insanas ferozes)
na parede da sala de estar

o velho oratório de séculos
coberto com terços e palhas
— um dia retiraram o oratório da sala
e o gado da fazenda desabou a morrer!
um por um rez por rez vez por vez
os mortos na casa da memória
estão aqui, ao meu lado e comigo
e me dão notícias de mim mesmo
de antepassados que não conheci
e dos heróis de armas e brasões
suicídios, loucuras, amores vãos
se queixam também, os mortos na casa
outros são alegres e certos de si
(subindo esta longa e íngreme ladeira
ainda está lá em cima no topo da colina
o arraial fundado sobre o nada
pelos parentes da família Silva
bem antes do azul do século vinte

e de sua boca carcomida escorre estranha saliva)
são estas as recordações da casa dos mortos
e estou comigo aqui no velho casarão
da família materna da família eterna
e já não sei quem são os mortos
e quem são os vivos

— se os vivos estão mortos
ou se os mortos é que estão vivos!
  ai miei antenati

nella casa della memoria
i morti sono vivi
come la vecchia e frondosa
jabuticaba nel cortile

— è l’albero della nostra stirpe!
mi dicono loro senza che io chieda
sono vivi loro, vivi
in questa strana fotografia
assente e livida in sé stessa
e mi guardano e mi ascoltano
e mi conoscono e mi seguono e mi dicono
tutto dal fondo del loro sonoro silenzio
immobili si muovono, fluttuano
in sé stessi i morti
che abitano la casa
con costumi d’epoca
— cappelli, abiti, bastoni
e lunghi mantelli a ruota
stanno dentro l’invisibile
e la materia del tempo
al mio fianco — e nell’infinito
quanti ha davvero questa
casa? Un centocinquant’anni?
e l’altra casa, dentro di questa?

il suo aroma forte e antico
di legni nobili, le sue
pareti bianche di calce
le sue immense finestre e porte
aperte verso le verdi piantagioni di caffè
(quando mio nonno giunse qui
ancora molto giovane, la casa era già vecchia
e di notte le pantere in branchi
graffiavano queste porte e finestre
affamate folli feroci)
sulla parete del soggiorno

l’oratorio vecchio di secoli
coperto di rosari e di paglia
— un giorno portarono via l’oratorio dalla casa
e il bestiame della fattoria cominciò a morire!
uno per uno capo per capo uno alla volta
i morti nella casa della memoria
sono qui, al mio fianco e con me
e mi portano notizie di me
e degli antenati che non ho conosciuto
e degli eroi in armi e vessilli
suicidi, follie, tristi amori
che ancora si piangono, altri morti
nella casa sono gioiosi e sicuri di sè
(salendo questo lungo e ripido pendio
ancora vi è là in cima in vetta alla collina
il bivacco fondato sul nulla
dai parenti della famiglia Silva
molto prima del blu del ventesimo secolo

e dalla sua imboccatura consunta scorre una strana saliva)
sono questi i ricordi della casa dei morti
e io sto qui con me nel vecchio edificio
della famiglia materna della famiglia eterna
e ormai non so più chi sono i morti
e chi sono i vivi

— se sono i vivi a esser morti
o se sono i morti a esser vivi!
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Luigi Lupi
Il borgo dei fantasmi (2011)
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