Canção do gato neutro


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Canção do gato neutro
Canzone del gatto sterilizzato


  à memória de Manuel António Pina

É preciso ser-se cruel (ou ímpio ou indiferente)
para gizar um plano destes. Conchegá-lo
a noite inteira e arrancar de madrugada pelo
frio de dezembro para o tornar um gato neutro.
Oh, cínico eufemismo. É preciso ser-se homem para
poder compreender que
«neutro» nunca será um
felino que perdeu a doce agressividade (o
esgar provocador ao arrulhar sua dona
o desleixo varonil de urinar no seu canto)
sem nunca ter tido o prazer de rondar
uma gatita. Como te vou receber quando
regressares a casa (cicatriz
no baixo ventre
dormente e abatido) o
olhar enlanguescido impossível de apagar
se fui eu o responsável por te levar pela manhã
se não o arquitecto do plano seu
dúplice executante?
«Neutro» dizem elas
estás «neutro». Confiavas gato em mim
como se abraça um pai ou
um desses bons amigos da cruel adolescência
que às ocultas nos levavam à mundana
iniciação. «Neutro» dizem elas
estás «neutro». Hitler não
diria melhor.
  in memoria di Manuel António Pina

Devi essere spietato (o empio o indifferente)
per tramare un piano simile. Tenertelo vicino
tutta la notte e portarlo fuori di buon’ora nel
freddo di dicembre per renderlo un gatto neutro.
Oh, cinico eufemismo. Bisogna essere un uomo per
poter capire che
da «neutro» non potrà mai più essere un
felino che ha perduto la tenera aggressività (il
piglio provocante ai trilli della padrona
la maschia noncuranza di urinare nel suo angolino)
non avendo mai avuto il piacere d’amoreggiare
con una gattina. Come ti accoglierò quando
farai ritorno a casa (cicatrice
nel basso ventre
frastornato e abbattuto) lo
sguardo svigorito che mai potrò scordare
se mia è la colpa d’averti portato fuori all’alba
se non l’autore del piano sono il suo
duplice mandante?
«Neutro» dicono loro
sei «neutro». Tu gatto avevi fiducia in me
come ci si affida a un padre o
ad uno di quei buoni amici della dura adolescenza
che in segreto ci portavano alla mondana
iniziazione. «Neutro» dicono loro
sei «neutro». Hitler non
avrebbe detto di meglio.
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Endre Penovac
Gatto nero (2015)
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